2010–2019
Proteger as Crianças
Outubro 2012


16:34

Proteger as Crianças

Ninguém deve recusar o pedido de que nos unamos para aumentar nossa preocupação com o bem-estar e o futuro de nossos filhos — a nova geração.

Todos podemos lembrar os sentimentos que tivemos quando uma criancinha chorou e nos estendeu os braços pedindo ajuda. O amoroso Pai Celestial nos deu esses sentimentos para impelir-nos a ajudar Seus filhos. Peço que relembrem esses sentimentos enquanto falo de nossa responsabilidade de proteger as crianças e de agir em favor do bem-estar delas.

Falo da perspectiva do evangelho de Jesus Cristo, incluindo Seu plano de salvação. Esse é meu chamado. Os líderes locais da Igreja têm responsabilidade por uma única jurisdição, como uma ala ou estaca, mas um apóstolo tem a responsabilidade de testificar ao mundo inteiro. Em toda nação, de todas as raças e credos, todas as crianças são filhas de Deus.

Embora eu não fale em termos políticos ou de normas públicas, da mesma forma que outros líderes da Igreja, não posso falar em favor do bem-estar das crianças sem que haja implicações no tocante às escolhas feitas por cidadãos, líderes públicos e funcionários de organizações particulares. Todos recebemos do Salvador o mandamento de amar e cuidar uns dos outros, especialmente dos fracos e indefesos.

As crianças são extremamente vulneráveis. Elas têm pouca ou nenhuma capacidade de proteger-se ou de suster-se e pouca influência em grande parte do que é vital para seu bem-estar. As crianças precisam de outros que falem por elas e precisam de outros que tomem decisões e que coloquem o bem-estar delas acima dos interesses egoístas dos adultos.

I.

No mundo inteiro, ficamos chocados com os milhões de crianças que são vítimas de crimes e do egoísmo de adultos maldosos.

Em alguns países varridos pela guerra, as crianças são raptadas para servir como soldados dos exércitos combatentes.

Um relatório das Nações Unidas estima que mais de dois milhões de crianças a cada ano são vítimas da prostituição e da pornografia.1

Da perspectiva do plano de salvação, uma das formas mais graves de abuso de crianças é negar-lhes o nascimento. Essa é uma tendência mundial. O índice de natalidade nacional nos Estados Unidos é o mais baixo em 25 anos2 e o índice de natalidade da maioria dos países europeus e asiáticos tem estado abaixo do nível de reposição, há muitos anos. Essa não é apenas uma questão religiosa. À medida que as novas gerações diminuem em número, as culturas e até as nações se esvaziam e acabam desaparecendo.

Uma das causas da diminuição do índice de natalidade é a prática do aborto. No mundo inteiro, estima-se que haja mais de 40 milhões de abortos por ano.3 Há muitas leis que permitem ou até promovem o aborto, mas para nós esse é um ato maligno. Outros abusos de crianças que ocorrem durante a gestação são as lesões fetais resultantes da nutrição inadequada da mãe ou do uso de drogas.

Há uma trágica ironia na multidão de crianças eliminadas ou lesadas antes do nascimento, ao passo que inúmeros casais inférteis anseiam e procuram um bebê para adotar.

Os abusos e as negligências cometidos contra crianças depois do nascimento são mais visíveis ao público. No mundo inteiro, quase oito milhões de crianças morrem antes do quinto ano de vida, a maioria de doenças cujo tratamento e prevenção são possíveis.4 A Organização Mundial de Saúde relata que uma em cada quatro crianças tem o desenvolvimento mental ou físico prejudicado devido a nutrição inadequada.5 Por morar em vários países e viajar bastante, nós, líderes da Igreja, vemos muito disso. A presidência geral da Primária relatou que existem crianças vivendo em condições que “nem imaginamos”. Uma mãe nas Filipinas disse: “Às vezes não temos dinheiro suficiente para comprar comida, mas tudo bem porque isso me dá a oportunidade de ensinar meus filhos a respeito da fé. Nós nos reunimos e oramos pedindo ajuda, e as crianças veem o Senhor nos abençoar”.6 Na África do Sul, uma líder da Primária encontrou uma menininha solitária e triste. Em suas tímidas respostas a perguntas feitas com amor, ela disse que não tinha nem mãe nem pai nem avó — apenas um avô para cuidar dela.7 Essas tragédias são comuns em um continente no qual muitos cuidadores morreram de AIDS.

Mesmo nas nações ricas, as criancinhas e os jovens são prejudicados pela negligência. As crianças que crescem na pobreza contam com atendimento de saúde inferior e oportunidades educacionais inadequadas. Também são expostas a ambientes perigosos no meio cultural e físico em que vivem e até mesmo pela negligência dos pais. O Élder Jeffrey R. Holland contou recentemente o que um policial SUD vivenciou. Em uma investigação, ele encontrou cinco criancinhas encolhidas num canto da casa, tentando dormir sem cobertor no chão sujo de uma habitação em que a mãe e outros homens estavam bebendo e se divertindo. Não havia nenhum alimento no apartamento para aliviar-lhes a fome. Depois de colocar as crianças numa cama improvisada, o policial se ajoelhou e orou pedindo que fossem protegidas. Ao caminhar para a porta, uma delas, que tinha uns seis anos, foi atrás dele, agarrou-o pela mão e implorou: “Pode me adotar, por favor?”8

Lembramos o ensinamento do Salvador quando Ele colocou uma criancinha diante de Seus seguidores e declarou:

“E qualquer que receber em meu nome um menino, tal como este, a mim me recebe.

Mas, qualquer que escandalizar um destes pequeninos, que creem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma mó de azenha, e se submergisse na profundeza do mar” (Mateus 18:5–6).

Quando pensamos nos perigos dos quais as crianças precisam ser protegidas, devemos também incluir o abuso psicológico. Os pais, outros cuidadores, professores ou colegas que rebaixam, maltratam ou humilham crianças ou jovens podem infligir-lhes um trauma mais permanente do que as lesões físicas. Fazer uma criança ou um jovem sentir que ele não tem valor, que não é amado ou que não é benquisto é algo que pode infligir danos graves e duradouros a seu bem-estar e desenvolvimento emocional.9 Os jovens que se debatem com qualquer condição excepcional, inclusive a atração por pessoas do mesmo sexo, são particularmente vulneráveis e precisam de compreensão amorosa — não de maus-tratos ou exclusão.10

Com a ajuda do Senhor, podemos nos arrepender, mudar e ser mais amorosos e prestativos com as crianças — com nossos próprios filhos ou com as crianças a nosso redor.

II.

Aqui estão alguns exemplos de ameaças físicas ou emocionais para as crianças, que são tão importantes quanto as que decorrem de seu relacionamento com os pais ou responsáveis. O Presidente Thomas S. Monson falou do que ele chamou de “comportamento abominável e hediondo”, referindo-se aos abusos e maus-tratos de crianças, nos quais um pai ou uma mãe fere ou desfigura um filho, tanto física quanto emocionalmente.11 Angustiou-me ter de analisar as chocantes evidências desses casos durante meu serviço na Suprema Corte de Utah.

De suma importância para o bem-estar das crianças é o fato de seus pais serem ou não casados, a natureza e a duração do casamento e, de modo mais abrangente, a cultura e as expectativas em relação ao casamento e à criação dos filhos no lugar em que moram. Dois estudiosos da família explicaram: “Ao longo da história, o casamento foi a primeira e a principal instituição para a procriação e a criação dos filhos. Esse foi o laço cultural que procurava conectar o pai a seus filhos, unindo-o à mãe de seus filhos. Em tempos recentes, porém, os filhos têm sido cada vez mais afastados do centro das atenções”.12

Um professor de Direito da universidade de Harvard descreveu as leis e a atitude atuais em relação ao casamento e ao divórcio: “A [atual] história americana do casamento, contada pelas leis e na literatura popular, diz mais ou menos o seguinte: o casamento é um relacionamento que existe principalmente para a satisfação individual dos cônjuges. Se ele deixar de cumprir essa função, ninguém tem culpa e qualquer dos cônjuges pode encerrá-lo à vontade. (…) Os filhos raramente aparecem na história. Quando muito são personagens secundários no fundo do cenário”.13

Os líderes da nossa Igreja ensinam que considerar o casamento “como um mero contrato que pode ser assumido a bel-prazer (…) e encerrado à primeira dificuldade (…) é um ato maligno que merece severa condenação”, especialmente quando faz com que “os filhos sofram”.14 E os filhos sofrem as consequências do divórcio. Mais da metade dos divórcios de um ano recente envolvia casais com filhos menores de idade.15

Muitos filhos teriam a bênção de ser criados por ambos os pais, se estes tivessem apenas seguido este ensinamento inspirado da proclamação sobre a família: “O marido e a mulher têm a solene responsabilidade de amar-se mutuamente e amar os filhos. (…) Os pais têm o sagrado dever de criar os filhos com amor e retidão, atender a suas necessidades físicas e espirituais, [e] ensiná-los a amar e servir uns aos outros”.16 O meio mais eficaz de ensinar os filhos é pelo exemplo dos pais. O divórcio dos pais inevitavelmente lhes ensina uma lição negativa.

Sem dúvida, há casos em que o divórcio é necessário para o bem dos filhos, mas essas circunstâncias são excepcionais.17 Na maioria dos litígios conjugais, os pais que brigam deveriam dar um peso bem maior aos interesses dos filhos. Com a ajuda do Senhor, eles conseguem fazer isso. As crianças precisam da força emocional e pessoal que advém do fato de serem criados por pai e mãe que são unidos em seu casamento e em suas metas. Como alguém que foi criado por uma mãe viúva, sei por experiência própria que nem sempre isso pode ser alcançado, mas esse é o ideal que deve ser buscado sempre que possível.

As crianças são as primeiras vítimas das leis atuais que permitem o chamado “divórcio sem causa”. Do ponto de vista dos filhos, o divórcio é muito fácil. Resumindo décadas de pesquisa sociológica, um cuidadoso estudioso concluiu que “a estrutura familiar que produz os melhores resultados para os filhos, em média, são pai e mãe biológicos que permanecem casados”.18 Um colunista do New York Times observou “o fato marcante de que mesmo que os casamentos tradicionais tenham diminuído nos Estados Unidos, (…) aumentaram muito as evidências da importância dessa instituição para o bem-estar dos filhos”.19 Essa realidade deve fornecer uma importante diretriz para os pais e futuros pais em suas decisões referentes ao casamento e ao divórcio. Também precisamos que os políticos, legisladores e governantes prestem mais atenção ao que é melhor para as crianças, em vez de concentrar-se nos interesses egoístas dos eleitores e dos defensores militantes de interesses dos adultos.

As crianças também são vítimas de casamentos que não acontecem. Poucas avaliações do bem-estar da nova geração são mais perturbadoras do que o informe recente de que 41% das crianças nascidas nos Estados Unidos são filhos de mulheres que não se casaram.20 As mães não casadas enfrentam enormes desafios, sendo claras as evidências de que os filhos delas estão em significativa desvantagem quando comparados a filhos criados por pai e mãe casados.21

A maior parte dos filhos nascidos de mães não casadas — 58% — nasceram de casais que coabitavam.22 Seja o que for que se possa dizer sobre esses casais que não se casam, os estudos mostram que seus filhos sofrem significativas desvantagens comparativas.23 Para os filhos, a relativa estabilidade do casamento realmente importa.

Devemos presumir as mesmas desvantagens para as crianças criadas por um casal de pessoas do mesmo sexo. Os estudos sociológicos são controversos e politicamente tendenciosos no tocante aos efeitos a longo prazo sobre essas crianças, principalmente porque, como um colunista do New York Times observou, “o casamento entre pessoas do mesmo sexo é uma experiência social, e como a maioria das experiências, levará tempo para se compreender suas consequências”.24

III.

Falei em favor das crianças — as crianças do mundo inteiro. Talvez haja quem rejeite alguns desses exemplos, mas ninguém deve recusar o pedido de que nos unamos para aumentar nossa preocupação com o bem-estar e o futuro de nossos filhos — a nova geração.

Estamos falando de filhos de Deus, e com Sua poderosa ajuda, podemos fazer mais para ajudá-los. Nesse pedido, dirijo-me não apenas aos santos dos últimos dias, mas às pessoas de todas as religiões e a outros que têm um sistema de valores que faz com que subordinem suas próprias necessidades às necessidades de outros, especialmente em favor do bem-estar das crianças.25

As pessoas religiosas também estão cientes do ensinamento do Salvador contido no Novo Testamento de que as puras criancinhas são o modelo de humildade e capacidade de ser ensinadas:

“Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos fizerdes como meninos, de modo algum entrareis no reino dos céus.

Portanto, aquele que se tornar humilde como este menino, esse é o maior no reino dos céus” (Mateus 18:3–4).

No Livro de Mórmon, lemos que o Senhor ressuscitado ensinou aos nefitas que eles precisavam se arrepender e ser batizados “e [se tornar] como uma criancinha” ou não poderiam herdar o reino de Deus (3 Néfi 11:38; ver também Morôni 8:10).

Oro para que nos tornemos humildes como as criancinhas e estendamos a mão para protegê-las, porque são o futuro para nós, para nossa Igreja e para nossas nações. Em nome de Jesus Cristo. Amém.

Notas

  1. Ver UNICEF, The State of the World’s Children 2005: Childhood under Threat, 2004, p. 26.

  2. Ver Haya El Nasser, “National Birthrate Lowest in 25 Years”, USA Today, 26 de julho de 2012, p. A1.

  3. Ver Gilda Sedgh e outros, “Induced Abortion: Incidence and Trends Worldwide from 1995 to 2008”, The Lancet, vol. 379, nº 9816 (18 de fevereiro de 2012), pp. 625–632.

  4. Ver UNICEF, “Young Child Survival and Development”, http://www.unicef.org/childsurvival/index.html.

  5. Ver World Health Organization, World Health Statistics 2012, pp. 109, 118.

  6. Relatório da presidência geral da Primária, 13 de setembro de 2012.

  7. Relatório da presidência geral da Primária.

  8. Ver Jeffrey R. Holland, “Israel, Israel, God Is Calling”, (Devocional do Sistema Educacional para jovens adultos, 9 de setembro de 2012) LDS.org/broadcasts; ver também R. Scott Lloyd, “Zion Not Only Where, but How We Live, Says Elder Holland,” Deseret News, 10 de setembro de 2012, p. B2.

  9. Ver Kim Painter, “Parents Can Inflict Deep Emotional Harm”, USA Today, 30 de julho de 2012, p. B8; Rachel Lowry, “Mental Abuse as Injurious as Other Forms of Child Abuse, Study Shows”, Deseret News, 5 de agosto de 2012, p. A3.

  10. Ver “End the Abuses”, Deseret News, 12 de junho de 2012, p. A10.

  11. Thomas S. Monson, “Filhos Preciosos, uma Dádiva de Deus”, A Liahona, junho de 2000, p. 2.

  12. W. Bradford Wilcox e Elizabeth Marquardt, eds., The State of Our Unions: Marriage in America, 2011, p. 82.

  13. Mary Ann Glendon, Abortion and Divorce in Western Law: American Failures, European Challenges, 1987, p. 108.

  14. David O. McKay, “Structure of the Home Threatened by Irresponsibility and Divorce”, Improvement Era, junho de 1969, p. 5.

  15. Ver Diana B. Elliott and Tavia Simmons, “Marital Events of Americans: 2009”, American Community Survey Reports, agosto de 2011.

  16. “A Família: Proclamação ao Mundo”, A Liahona, novembro de 2010, última contracapa.

  17. Ver Dallin H. Oaks, “Divórcio”, A Liahona, maio de 2007, p. 70.

  18. Charles Murray, Coming Apart: The State of White America, 1960–2010, 2012, p. 158.

  19. Ross Douthat, “Gay Parents and the Marriage Debate”, New York Times, 11 de junho de 2012, http://douthat.blogs.nytimes.com/2012/06/11/gay-parents-and-the-marriage-debate/.

  20. Ver Joyce A. Martin e outros, “Births: Final Data for 2010”, National Vital Statistics Reports, vol. 60, nº 1 (agosto de 2012), p. 10.

  21. Ver William J. Doherty e outros, Why Marriage Matters: Twenty-One Conclusions from the Social Sciences, 2002; W. Bradford Wilcox e outros, Why Marriage Matters: Thirty Conclusions from the Social Sciences, 3ª ed., 2011.

  22. Ver Martin e outros, “Births: Final Data for 2010”, pp. 10–11.

  23. Ver Wilcox e outros, Why Marriage Matters.

  24. Douthat, “Gay Parents and the Marriage Debate”. O último e mais minucioso estudo encontra desvantagens significativas relatadas por jovens adultos que têm um dos pais que se envolveu em um relacionamento com pessoa do mesmo sexo antes de o filho ter 18 anos de idade (ver Mark Regnerus, “How Different Are the Adult Children of Parents Who Have Same-Sex Relationships? Findings from the New Family Structures Study”, Social Science Research, vol. 41, 2012, pp. 752–770).

  25. Os santos dos últimos dias estão especialmente comprometidos com o papel de pais, considerando-o uma das metas mais importantes da vida (ver Pew Research Center’s Forum on Religion and Public Life, Mormons in America: Certain in Their Beliefs, Uncertain of Their Place in Society, 12 de janeiro de 2012, pp. 10, 16, 51).