2010–2019
“Ele Ressuscitou!”
Abril 2010


2:3

“Ele Ressuscitou!”

O sepulcro vazio daquela primeira manhã de Páscoa foi a resposta para a pergunta de Jó: “Morrendo o homem, porventura voltará a viver?”

Tivemos uma excelente sessão. Em nome de todos os que participaram até agora com discursos e com música, como Presidente da Igreja, quero simplesmente dirigir-lhes apenas duas palavras, que podem ser consideradas as mais importantes de nosso idioma. Para a irmã Cheryl Lant e suas conselheiras, para o coro, para os músicos, para os oradores, as palavras são: “Muito obrigado”.

Há muitos anos, quando estava em Londres, Inglaterra, visitei a famosa galeria de arte Tate. Havia obras de Gainsborough, Rembrandt, Constable e de outros renomados artistas expostas em muitas e muitas salas. Admirei a beleza delas e reconheci a habilidade necessária para criar aquelas obras- primas. Mas, escondida num canto tranquilo do terceiro andar, havia uma pintura que não apenas me chamou a atenção, mas também me cativou o coração. O artista, Frank Bramley, pintou o interior de uma humilde casinha de frente para o mar revolto. Duas mulheres, a mãe e a esposa de um pescador ausente, haviam passado a noite observando o mar e esperando o retorno do pescador. A noite chegara ao fim, e elas se deram conta de que ele estava perdido no mar e que não voltaria. Ajoelhada junto à sogra, com a cabeça apoiada no colo da mulher mais idosa, a jovem esposa chorava em desespero. A vela consumida no batente da janela fazia um relato da vigília inútil.

Senti o sofrimento da jovem mulher, senti sua dor. O título assombrosamente vívido que o artista deu a sua obra narra a trágica história. O quadro se chama: Um Amanhecer de Desesperança.

Oh, como a jovem mulher ansiava pelo consolo, sim, pela realidade do “Réquiem” de Robert Louis Stevenson:

O marinheiro volta para casa, retornando do mar.

E o caçador, vindo dos montes, retorna ao lar.1

Dentre todos os fatos da mortalidade, nenhum é tão certo quanto o seu fim. A morte vem para todos, é nossa “herança universal; pode reclamar sua vítima na infância ou na juventude, na plenitude da vida ou sua intimação pode ser retardada até que as neves do tempo se tenham acumulado sobre a cabeça encanecida; ela pode ocorrer como resultado de acidente ou doença (…) ou (…) de causas naturais; mas virá”.2 Inevitavelmente, representa uma perda dolorosa e, particularmente nos jovens, um golpe esmagador para os sonhos desfeitos, as ambições insatisfeitas e as esperanças destruídas.

Qual é o ser mortal que ao se deparar com a perda de um ente querido ou ao se colocar pessoalmente no limiar do infinito não se perguntou o que existe além do véu que separa o visível do invisível?

Há vários séculos, um homem chamado Jó — que por tanto tempo fora abençoado com todas as dádivas materiais e se viu dolorosamente afligido por tudo o que poderia acometer um ser humano — sentou-se com seus companheiros e proferiu a eterna e sempre atual pergunta: “Morrendo o homem, porventura tornará a viver? ”3 Jó expressou o que todo ser humano vivo já se perguntou.

Nesta gloriosa manhã de Páscoa, gostaria de refletir sobre a pergunta de Jó: “Morrendo o homem, porventura tornará a viver?” e dar a resposta que não vem apenas da reflexão ponderada, mas também da palavra revelada de Deus. Começarei pelas coisas fundamentais.

Se há um plano que rege este mundo em que vivemos, é preciso haver um Autor. Quem pode contemplar as muitas maravilhas do universo sem acreditar que existe um plano para toda a humanidade? Quem pode duvidar que exista um Autor?

No livro de Gênesis aprendemos que o Grande Autor criou os céus e a Terra. “E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo.”

“Haja luz”, disse o Grande Autor, “e houve luz”. Ele criou um firmamento. Separou a porção seca das águas e disse: “Produza a terra erva verde, (…) árvore frutífera que dê fruto segundo a sua espécie, cuja semente está nela”.

Criou dois luminares: o Sol e a Lua. As estrelas surgiram por desígnio Seu. Ordenou que houvesse criaturas vivas nas águas e aves para voar sobre a Terra. E assim foi. Fez o gado, as bestas e as criaturas rastejantes. O plano estava quase completo.

Por último, Ele criou o homem a Sua própria imagem — macho e fêmea — tendo domínio sobre todas as outras coisas vivas.4

Somente o homem recebeu inteligência: um cérebro, uma mente e uma alma. Somente o homem, com esses atributos, tinha a capacidade de ter fé e esperança, inspiração e ambição.

Quem poderia persuasivamente argumentar que o homem, a mais nobre obra do Grande Autor, com domínio sobre todas as coisas vivas, com um cérebro e uma vontade, com uma mente e uma alma, com inteligência e divindade, chegaria ao fim quando o espírito deixasse seu templo terreno?

Para compreender o significado da morte, precisamos prezar o propósito da vida. A fraca luz da crença precisa dar lugar ao sol do meio-dia da revelação, por meio da qual sabemos que vivemos antes de nosso nascimento na mortalidade. Em nosso estado pré-mortal, estivemos sem dúvida entre os filhos e as filhas de Deus que rejubilaram por causa da oportunidade de vir para esta desafiadora, porém necessária existência mortal.5 Sabíamos que nosso propósito era ganhar um corpo físico, vencer as provações e mostrar que cumpriríamos os mandamentos de Deus. Nosso Pai sabia que, devido à natureza da mortalidade, seríamos tentados, pecaríamos e falharíamos. Para que pudéssemos ter todas as chances de sucesso, Ele providenciou um Salvador que sofreria e morreria por nós. Ele não apenas expiaria nossos pecados, mas como parte dessa Expiação, também venceria a morte física, à qual nos tornaríamos sujeitos devido à Queda de Adão.

E assim, há mais de 2.000 anos, Cristo, nosso Salvador, nasceu na vida mortal em um estábulo em Belém. O Messias que fora predito por tanto tempo havia chegado.

Há pouquíssima coisa escrita sobre a infância de Jesus. Gosto muito desta passagem de Lucas: “E crescia Jesus em sabedoria, e em estatura, e em graça para com Deus e os homens”.6 E no livro de Atos há uma breve frase a respeito do Salvador que está repleta de significado: “[Ele] andou fazendo bem”.7

Foi batizado por João no rio Jordão. Chamou os Doze Apóstolos. Abençoou os enfermos. Fez o coxo andar, o cego ver, o surdo ouvir. Até chamou o morto de volta à vida. Ensinou, testificou e deixou um exemplo para seguirmos.

Então, a missão mortal do Salvador do mundo chegou ao fim. Uma última ceia com Seus Apóstolos teve lugar no cenáculo. Adiante estavam o Getsêmani e a cruz do Calvário.

Um mero mortal não consegue conceber a plena importância do que Cristo fez por nós no Getsêmani. O próprio Salvador, mais tarde, descreveu o que aconteceu: “[O] sofrimento (…) fez com que eu, Deus, o mais grandioso de todos, tremesse de dor e sangrasse por todos os poros; e sofresse, tanto no corpo como no espírito”.8

Depois da agonia do Getsêmani, com as forças esgotadas, foi agarrado por homens cruéis e rudes, para ser levado perante Anás, Caifás, Pilatos e Herodes. Foi acusado e amaldiçoado. Golpes violentos enfraqueceram ainda mais Seu corpo doído. Sangue escorreu-Lhe pelo rosto quando uma cruel coroa feita de espinhos Lhe foi colocada à força, ferindo-Lhe a testa. Depois, foi novamente levado para Pilatos, que cedeu aos gritos da população enfurecida: “Crucifica-o, crucifica-o”.9

Foi açoitado com um chicote de múltiplas tiras de couro, com pedaços de metal e osso nas pontas. Ao erguer-Se da crueldade do açoite, com passos vacilantes carregou a própria cruz até não conseguir mais prosseguir, e outro carregou-Lhe o fardo.

Por fim, num monte chamado Calvário, sob o olhar dos indefesos seguidores, Seu corpo ferido foi pregado à cruz. Zombaram Dele, foi amaldiçoado e desprezado sem piedade. Contudo ainda assim clamou: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.10

Passaram-se horas agonizantes enquanto Sua vida se esvaía. De seus lábios ressequidos ouviram-se as palavras: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito. E, havendo dito isto, expirou”.11

Quando a serenidade e o consolo de uma morte misericordiosa O libertaram dos sofrimentos da mortalidade, Ele voltou à presença de Seu Pai.

No último momento, o Mestre poderia ter desistido. Mas não o fez. Desceu abaixo de todas as coisas para que pudesse salvar todas as coisas. Seu corpo inerte foi rápida, porém gentilmente colocado em um sepulcro emprestado.

Não há palavras na cristandade que signifiquem mais para mim do que as que foram proferidas pelo anjo para a chorosa Maria Madalena e a outra Maria quando, no primeiro dia da semana, foram ao sepulcro para cuidar do corpo do Senhor. O anjo disse:

“Por que buscais o vivente entre os mortos?

Não está aqui, mas ressuscitou”.12

Nosso Salvador voltou a viver. O mais glorioso, reconfortante e consolador de todos os acontecimentos da história humana havia ocorrido: a vitória sobre a morte. A dor e a agonia do Getsêmani e do Calvário haviam sido removidas. A salvação da humanidade havia sido garantida. A Queda de Adão fora regenerada.

O sepulcro vazio daquela primeira manhã de Páscoa foi a resposta para a pergunta de Jó: “Morrendo o homem, porventura voltará a viver?” A todos que me escutam declaro: Se um homem morrer, ele voltará a viver. Sabemos disso, porque temos a luz da verdade revelada. “Porque assim como a morte veio por um homem, também a ressurreição dos mortos veio por um homem. Porque, assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo.”13

Li o testemunho daqueles que sentiram a angústia da crucificação de Cristo e a alegria de Sua Ressurreição, e acredito no depoimento deles. Li o testemunho das pessoas do Novo Mundo que foram visitadas pelo mesmo Senhor ressuscitado, e acredito nesse relato.

Acredito no testemunho de alguém que, nesta dispensação, falou com o Pai e o Filho em um bosque que hoje é chamado sagrado e que deu a vida, selando esse testemunho com o próprio sangue. Ele declarou:

“E agora, depois dos muitos testemunhos que se prestaram dele, este é o testemunho, último de todos, que nós damos dele: Que ele vive!

Porque o vimos, sim, à direita de Deus; e ouvimos a voz testificando que ele é o Unigênito do Pai”.14

As trevas da morte sempre podem ser dissipadas pela luz da verdade revelada. “Eu sou a ressurreição e a vida”, disse o Mestre.15 “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou.”16

Ao longo dos anos ouvi e li inúmeros testemunhos, prestados por pessoas que testificaram da realidade da Ressurreição e que receberam, em seus momentos de maior necessidade, a paz e o consolo prometidos pelo Salvador.

Vou contar-lhes parte de um desses relatos. Há duas semanas, recebi uma tocante carta de um pai de sete filhos que escreveu sobre sua família, particularmente sobre seu filho Jason, que adoeceu quando tinha onze anos de idade. Nos anos que se seguiram, Jason teve várias recaídas. O pai contou sobre a atitude positiva de Jason e sua calorosa disposição, a despeito de seus problemas de saúde. Jason recebeu o Sacerdócio Aarônico aos doze anos e “sempre magnificou suas responsabilidades com disposição e excelência, quer se sentisse bem ou não”. Recebeu o prêmio máximo do escotismo quando tinha quatorze anos.

No ano passado, pouco depois de seu aniversário de quinze anos, Jason foi novamente hospitalizado. Em uma de suas visitas ao hospital, o pai dele o encontrou de olhos fechados. Sem saber se Jason estava dormindo ou acordado, o pai começou a conversar baixinho com ele. “Jason”, disse ele, “sei que você passou por muita coisa em sua vida e que sua situação atual é muito difícil. Embora você tenha uma imensa batalha à frente, não quero jamais que você perca a fé em Jesus Cristo”. Ele contou que se surpreendeu quando Jason imediatamente abriu os olhos e exclamou: “Nunca!”, numa voz clara e resoluta. Jason então fechou os olhos de novo e não disse mais nada.

O pai escreveu: “Naquela simples declaração, Jason expressou um dos mais vigorosos e puros testemunhos de Jesus Cristo que já ouvi. (…) À medida que o ‘Nunca!’ dele foi sendo gravado em minha alma naquele dia, meu coração se encheu de alegria pelo Pai Celestial haver-me concedido a bênção de ser pai de um rapaz tão imensamente nobre. (…) Aquela foi a última vez que o ouvi declarar seu testemunho de Cristo”.

Embora a família achasse que seria apenas outra internação de rotina, Jason morreu em menos de duas semanas. Um irmão e uma irmã mais velhos serviam como missionários, na época. Outro irmão, Kyle, acabara de receber seu chamado para a missão. Na verdade, o chamado tinha chegado antes do esperado e, em 5 de agosto, apenas uma semana antes do falecimento de Jason, a família se reuniu em seu quarto de hospital para que o chamado de Kyle pudesse ser aberto e compartilhado pela família inteira.

Em sua carta para mim, o pai incluiu uma fotografia de Jason no leito do hospital, com seu irmão mais velho, Kyle, a seu lado, segurando o chamado para a missão. Havia uma anotação embaixo da fotografia: “Chamados para servir missão juntos, em ambos os lados do véu”.

O irmão e a irmã de Jason que já estavam servindo missão enviaram belas cartas de consolo para serem lidas no funeral de Jason. Sua irmã, que servia na Missão Argentina Buenos Aires Oeste, escreveu em sua carta: “Sei que Jesus Cristo vive, e por causa disso, todos nós, inclusive nosso amado Jason, também vamos voltar a viver. (…) Podemos consolar-nos na certeza segura que temos de que fomos selados como uma família eterna. (…) Se dermos o melhor de nós para obedecer e ser melhores nesta vida, nós o veremos novamente”. Ela prosseguiu: “Uma escritura que há muito é minha favorita ganhou agora um novo significado e importância neste momento. (…) Está em Apocalipse, capítulo 21, versículo 4: ‘E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas’”.

Meus amados irmãos e irmãs, em nossos momentos de maior tristeza, podemos encontrar profunda paz nas palavras do anjo proferidas naquela primeira manhã de Páscoa: “Ele não está aqui, porque já ressuscitou”.17

Cristo é já ressuscitado

Proclamai com grande voz.

Do sepulcro é libertado

Exultemos todos nós!

Cristo a morte conquistou

Todo homem, pois, livrou!18

Como uma de Suas testemunhas especiais na Terra hoje, neste glorioso domingo de Páscoa, declaro que isso é verdade, em Seu sagrado nome, sim, em nome de Jesus Cristo, nosso Salvador. Amém.

  1. Robert Louis Stevenson, “Réquiem”, de An Anthology of Modern Verse, ed. por A. Methuen, 1921, p. 208.

  2. James E. Talmage, Jesus, o Cristo, 3.a ed., 1916, p. 20.

  3. Jó 14:14.

  4. Ver Gênesis 1:1–27.

  5. Ver Jó 38:7.

  6. Lucas 2:52.

  7. Atos 10:38.

  8. Doutrina e Convênios 19:18.

  9. Lucas 23:21.

  10. Lucas 23:34.

  11. Lucas 23:46.

  12. Lucas 24:5–6.

  13. I Coríntios 15:21–22.

  14. Doutrina e Convênios 76:22–23.

  15. João 11:25.

  16. João 14:27.

  17. Mateus 28:6.

  18. “Cristo É Já Ressuscitado”, Hinos, n.o 119.