A Expiação
Os propósitos da Criação, da Queda e da Expiação convergem todos para a obra sagrada realizada nos templos de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias.
Humildemente eu me associo ao profeta do Livro de Mórmon, Jacó, que perguntou: “Por que não falar, (…) da expiação de Cristo (…)?”1 Este tema consta de nossa 3a. Regra de Fé: “Cremos que, por meio do Sacrifício Expiatório de Cristo, toda a humanidade pode ser salva pela obediência às leis e ordenanças do Evangelho”.
Para podermos entender a Expiação de Cristo, contudo, precisamos primeiro entender a Queda de Adão. E para entendermos a Queda de Adão, precisamos primeiro entender a Criação. Esses três elementos decisivos do plano de salvação relacionam-se entre si.2
A Criação
A Criação culminou com Adão e Eva no Jardim do Éden. Eles foram criados à imagem de Deus, com um corpo de carne e ossos.3 Tendo sido criados à imagem de Deus, mas não sendo ainda mortais, eles não podiam envelhecer e morrer.4 “E não teriam tido filhos”5 nem passariam pelas provações da vida. (Perdoem-me por mencionar filhos e as provações da vida num só fôlego.) A criação de Adão e Eva foi uma criação paradisíaca, uma criação que exigia uma transformação significativa para que eles pudessem cumprir o mandamento de ter filhos6 e, assim, fornecer corpos para os filhos e filhas espirituais e pré-mortais de Deus.
A Queda
Isso nos leva à Queda. As escrituras ensinam que “Adão caiu para que os homens existissem; e os homens existem para que tenham alegria”.7 A Queda de Adão (e Eva) constituiu a criação mortal e efetuou as transformações necessárias em seu corpo, inclusive a circulação de sangue, além de outras mudanças.8 Eles tornaram-se, então, capazes de gerar filhos. Adão e Eva e sua posteridade também se tornaram sujeitos a ferimentos, doenças e morte. E um amoroso Criador abençoou-os com o poder de curar-se, pelo qual a vida e as funções de seu precioso corpo físico poderiam ser preservadas. Por exemplo, os ossos, se quebrados, poderiam solidificar-se novamente. Lacerações da carne poderiam sarar. E, miraculosamente, sangramentos poderiam ser estancados por componentes do próprio sangue que se estivesse perdendo.9
Pensem na maravilha desse poder de cura! Se tivéssemos a capacidade de criar alguma coisa que conseguisse consertar a si mesma, estaríamos criando vida perpétua. Por exemplo, se conseguíssemos criar uma cadeira que consertasse seu próprio pé, quando quebrado, não haveria limite para a vida dessa cadeira. Muitos de vocês caminham com pernas que já se quebraram, e fazem-no devido ao dom maravilhoso de curar-se que possuem.
Embora nosso Criador nos tenha investido desse incrível poder, Ele deu ao nosso corpo um dom que o contrabalança. É a bênção do envelhecimento, com seus alertas visíveis de que somos seres mortais destinados a, um dia, deixarmos este “frágil corpo mortal”.10 O corpo humano modifica-se todos os dias. Ao envelhecermos, nosso peito largo e nossa cintura estreita têm a tendência de trocar de posição. Ganhamos rugas, perdemos a cor do cabelo — e até mesmo o cabelo — a fim de que nos lembremos de que somos filhos mortais de Deus, com uma garantia do fabricante de que não ficaríamos abandonados na Terra eternamente. Se não fosse pela Queda, nossos médicos, cabeleireiros e coveiros estariam todos desempregados.
Adão e Eva — como seres mortais — receberam instruções para “que adorassem ao Senhor seu Deus e que oferecessem os primogênitos dos seus rebanhos como oferta ao Senhor”.11 Foi-lhes também ensinado que “a vida da carne está no sangue; (…) porquanto é o sangue que fará expiação pela alma”.12 As provações, a procriação e o envelhecimento eram todos componentes do “grande plano de felicidade”13 de Deus, para o qual a morte física era essencial.
A vida mortal, porém, grandiosa como é, nunca foi o objetivo final do plano de Deus. A vida e a morte aqui no planeta Terra são simplesmente meios para um fim — não o fim ou objetivo pelo qual fomos enviados a esta Terra.
A Expiação
Isso nos traz à Expiação. Paulo disse: “Porque, assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo”.14 A Expiação de Jesus Cristo tornou-se a criação imortal. Ele ofereceu-Se para cumprir os objetivos da lei previamente transgredida.15 E pelo derramamento de Seu sangue, Seu corpo físico16 e o nosso poderiam ser aperfeiçoados. Poderiam novamente funcionar sem o sangue, assim como o corpo de Adão e Eva em sua forma paradisíaca. Paulo ensinou que “a carne e o sangue não podem herdar o reino de Deus; (…) [sem que] isto que é mortal se revista da imortalidade”.17
O Significado da Expiação
Com esse panorama em mente, meditemos sobre o profundo significado da palavra expiação. Na língua inglesa, os componentes da palavra sugerem a expressão de uma só mente, ou seja, união entre pessoas. Outras línguas18 empregam palavras que significam reconciliação. Expiação significa “reparação”. Reconciliação vem de raízes latinas. RE significa “novamente”, con significa “com” e sella significa “assento”. Reconciliação, portanto, significa, literalmente, “sentar-se novamente com”.
Encontram-se ricos significados no estudo da palavra expiação nas línguas semíticas dos tempos do Velho Testamento. Em hebraico, a palavra básica para expiação é kaphar, um verbo que significa “cobrir” ou “perdoar”.19 Infimamente relacionada, encontramos a palavra aramaica e árabe kafat, que significa “um abraço apertado” — sem dúvida tendo relação com o ritual egípcio do abraço. Referências a esse abraço são evidentes no Livro de Mórmon. Diz-se que “o Senhor redimiu a minha alma (…); eu contemplei a sua glória e estarei eternamente envolvido pelos braços de seu amor”.20 Outra oferece a gloriosa esperança de nosso ser “envolvido pelos braços de Jesus”.21
Choro de alegria quando penso no significado de tudo isso. Ser redimido é receber a expiação — ser envolvido pelo abraço de Deus, ouvindo palavras que expressam não apenas o Seu perdão, mas também nossa unidade de coração e mente. Que privilégio! E que consolo para aqueles de nós que têm pessoas amadas, que já saíram de nosso círculo familiar através do portão que chamamos morte!
As escrituras nos ensinam mais acerca da palavra expiação. O Velho Testamento faz muitas referências à expiação, que requeria o sacrifício animal. Mas não era qualquer animal. Os requisitos incluíam:
-
a escolha de um primogênito do rebanho, sem mácula,22
-
o sacrifício de vida animal pelo derramamento de seu sangue,23
-
morte do animal sem quebrar-lhe um osso sequer,24 e a
-
possibilidade de um animal ser sacrificado, vicariamente, em lugar de outro.25
A Expiação de Cristo seguiu esses protótipos do Velho Testamento. Ele era o Cordeiro primogênito de Deus, sem mácula. Seu sacrifício ocorreu pelo derramamento de sangue. Nenhum osso de Seu corpo foi quebrado — sendo interessante observar que as pernas de ambos os malfeitores crucificados com o Senhor foram quebradas.26 E Seu sacrifício foi um sacrifício vicário.
Embora as palavras expiar e expiação, em qualquer de suas formas, apareçam apenas uma vez na tradução do Rei Jaime do Novo Testamento,27 elas aparecem 35 vezes no Livro de Mórmon.28 Como um outro testamento de Jesus Cristo, ele lança uma luz preciosa sobre Sua Expiação, assim como Doutrina e Convênios e Pérola de Grande Valor. As revelações destes últimos dias acrescentaram muito a nossa compreensão básica da história.
A Expiação Infinita
No período preparatório que foi o Velho Testamento, a prática da expiação era finita — isto é, tinha um fim. Era uma previsão simbólica da Expiação definitiva de Jesus, o Cristo. A Expiação Dele é infinita — não tem um fim.29 Foi também infinita no sentido de que toda a humanidade seria salva da morte sem fim. Foi infinita em termos de Seu imenso sofrimento. Foi infinita no tempo, colocando um fim ao protótipo anterior do sacrifício animal. Foi infinita em escopo — era para ser realizada de uma vez só por todos.30 E a misericórdia da Expiação estende-se não apenas a um número infinito de pessoas, mas também a um número infinito de mundos criados por Ele.31 Foi infinita além de qualquer escala humana de medida, ou mesmo da compreensão humana.
Jesus era o único que podia oferecer uma Expiação infinita, uma vez que Ele nasceu de mãe mortal e de Pai imortal. Devido a essa condição singular de Seu nascimento, Jesus era um Ser infinito.
A Agonia da Expiação
A agonia da Expiação centralizou-se nas cercanias da cidade de Jerusalém. Lá ocorreu o maior ato de amor de toda a história.32 Saindo do Cenáculo, Jesus e Seus amigos atravessaram o profundo desfiladeiro do lado leste da cidade e chegaram a um jardim de oliveiras que ficava na encosta do Monte das Oliveiras. Nesse jardim, que levava o nome hebraico de Getsêmani — significando “prensa de óleo” — as olivas eram pisadas e prensadas para fornecer azeite e alimento. No Getsêmani, o Senhor “sofreu a dor de todos os homens, para que todos pudessem arrepender-se e vir a Ele”.33 Jesus tomou sobre Si o peso dos pecados de toda a humanidade, carregando sua grande carga, o que O fez sangrar por todos os poros.34 Mais tarde, Ele foi espancado e chicoteado. Enfiaram-Lhe uma coroa de espinhos afiados na cabeça, como mais uma forma de tortura.35 Ele foi escarnecido e injuriado. Sofreu todo tipo de ultrajes nas mãos de Seu próprio povo. “Vim aos meus”, disse Ele, “e os meus não me receberam”.36 Em vez de seu caloroso abraço, recebeu sua cruel rejeição. Exigiram, então, que carregasse a própria cruz até o monte do Calvário, onde foi pregado na cruz e levado a sofrer uma dor excruciante.
Mais tarde, Ele disse: “Tenho sede”.37 Para um médico, tais palavras são muito significativas. Os médicos sabem que quando um paciente entra em estado de choque devido a perda de sangue, invariavelmente esse paciente — se ainda estiver consciente — com lábios rachados e ressequidos — pede água.
Embora o Pai e o Filho soubessem antecipadamente o que Ele iria passar, a realidade do fato provocou intensa agonia. “E [Jesus] disse: Aba, Pai, todas as coisas te são possíveis; afasta de mim este cálice; não seja, porém, o que eu quero, mas o que tu queres.”38 Jesus então submeteu-Se à vontade de Seu Pai.39 Três dias depois — precisamente como profetizado — Ele levantou-Se do túmulo. Tornou-Se as primícias da ressurreição. Realizara a Expiação, que poderia dar imortalidade e vida eterna a todos os seres humanos obedientes. Todos os que, por causa da Queda, se haviam desviado, por causa da Expiação puderam voltar ao caminho.
A dádiva da imortalidade foi concedida pelo Salvador a todos os que jamais viveram. A dádiva da vida eterna, porém, exige arrependimento e obediência a ordenanças e convênios específicos.
As ordenanças essenciais do evangelho simbolizam a Expiação. O batismo por imersão simboliza a morte, o sepultamento e a Ressurreição do Redentor. Ao participarmos do sacramento, renovamos os convênios batismais e também reavivamos nossa lembrança da carne dilacerada do Salvador e do sangue que Ele derramou por nós. As ordenanças do templo simbolizam nossa reconciliação com o Senhor e une as famílias para a eternidade. A obediência aos convênios sagrados feitos nos templos qualificam-nos para a vida eterna — a maior dádiva de Deus ao homem40 — “o objetivo e finalidade de nossa existência”.41
A Expiação permitiu que o propósito da Criação se realizasse
A Criação exigiu a Queda. A queda exigiu a Expiação. A Expiação permitiu que o propósito da Criação fosse alcançado. A vida eterna, possibilitada pela Expiação, é o propósito supremo da Criação. Para enunciar essa idéia em sua forma negativa, diremos que, se as famílias não fossem seladas nos templos sagrados, toda a Terra seria completamente destruída.42
Os propósitos da Criação, da Queda e da Expiação convergem todos para a obra sagrada realizada nos templos de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. A Terra foi criada e a Igreja restaurada para tornar possível o selamento da mulher ao marido, dos filhos aos pais, das famílias a seus progenitores, mundos sem fim.
Esta é a grande obra dos últimos dias da qual fazemos parte. É por isso que temos missionários; é por isso que temos templos: para levar as bênçãos plenas da Expiação aos filhos fiéis de Deus. É por isso que respondemos aos chamados que nos são feitos pelo Senhor. Quando compreendemos Sua Expiação voluntária, qualquer idéia de sacrifício de nossa parte é completamente sobrepujada por um profundo senso de gratidão pelo privilégio de servi-Lo.
Sendo uma das “testemunhas especiais do nome de Cristo no mundo todo”,43 testifico que Ele é o Filho do Deus vivo. Jesus é o Cristo — nosso Salvador e Redentor. Esta é Sua Igreja, restaurada para abençoar os filhos de Deus e preparar o mundo para a Segunda Vinda do Senhor. Isso testifico no sagrado nome de Jesus Cristo. Amém.