2000–2009
Qualidades Cristãs — O Vento Debaixo de Nossas Asas
Outubro 2005


Qualidades Cristãs — O Vento Debaixo de Nossas Asas

Viver de acordo com os princípios básicos do evangelho trará poder, força e auto-suficiência espiritual à vida dos santos dos últimos dias.

Queridos irmãos e irmãs, queridos amigos: Durante minha vida profissional como piloto de uma linha aérea, às vezes os passageiros iam à cabine do meu Boeing 747. Eles perguntavam sobre os muitos interruptores, instrumentos, sistemas e procedimentos e como esse equipamento técnico ajudaria um avião tão grande e lindo a voar.

Como todos os pilotos, eu gostava do fato de eles ficarem impressionados com a aparente complexidade desse avião e imaginarem que tipo de pessoa magnífica e brilhante seria necessária para operá-lo. Nesse ponto de minha história, minha esposa e meus filhos me interromperiam bondosamente para dizer com um piscar de olhos: “Os pilotos são tão humildes!”

Aos visitantes da minha cabine, eu explicaria que seria necessário um grande design aerodinâmico, muitos sistemas e programas auxiliares e motores potentes para fazer com que essa máquina voadora fosse capaz de trazer conforto e segurança às pessoas que embarcaram naquele vôo.

Para simplificar minha explicação, concentrando-me no básico, eu acrescentaria que tudo que é realmente necessário é um forte impulso, uma grande força de ascensão e saber o procedimento técnico correto; com isso, as leis da natureza carregam o 747 e seus passageiros em segurança através de continentes e oceanos, sobre altas montanhas e perigosas tempestades até seu destino.

Nos últimos anos, tenho visto muitas vezes que ser membro de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias leva-nos a fazer perguntas similares. Quais são os princípios básicos, fundamentais de nossa condição de membros da Igreja no reino de Deus na Terra? No final, o que realmente nos carregará em tempos de grande necessidade ao nosso almejado destino eterno?

A Igreja, com toda a sua estrutura e seus programas, oferece muitas atividades importantes para seus membros com o propósito de ajudar famílias e indivíduos a servirem a Deus e uns aos outros. Às vezes, contudo, pode parecer que esses programas e atividades estão mais próximos do centro de nosso coração e alma do que a essência das doutrinas e princípios do evangelho. Procedimentos, programas, normas administrativas e padrões de organização são úteis para nosso progresso espiritual aqui na Terra, mas não devemos esquecer que eles estão sujeitos a mudanças.

Em contrapartida, a essência do evangelho — a doutrina e os princípios — nunca mudarão. Viver de acordo com os princípios básicos do evangelho trará poder, força e auto-suficiência espiritual à vida dos santos dos últimos dias.

A fé é um princípio de tamanho poder! Precisamos dessa fonte de poder em nossa vida. Deus opera com poder, mas este geralmente é exercido em resposta à nossa fé. “A fé sem obras é morta”. (Tiago 2:20) Deus trabalha de acordo com a fé que Seus filhos demonstram.

O Profeta Joseph Smith explicou: “Eu lhes ensino princípios corretos e eles governam a si mesmos” (citado por John Taylor em “A Organização da Igreja”, Millennial Star, novembro de 1851, p. 339). Para mim, esse ensinamento é magnificamente direto. Ao nos esforçarmos por entender, interiorizar e viver os princípios corretos do evangelho, nós nos tornaremos mais auto-suficientes na parte espiritual. O princípio da auto-suficiência espiritual vem de uma doutrina fundamental da Igreja: a de que Deus nos deu o livre-arbítrio. Acredito que o arbítrio moral é um dos maiores dons que Deus concedeu a Seus filhos, além do dom da vida.

Quando estudo e pondero sobre o arbítrio moral e suas conseqüências eternas, percebo que somos verdadeiramente filhos de Deus e que, portanto, devemos agir de acordo. Esse entendimento também me faz lembrar de que, como membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, somos parte de uma grande família mundial de santos.

A estrutura da Igreja permite uma grande flexibilidade de acordo com o tamanho, o padrão de crescimento e as necessidades de nossas congregações. Existe o programa para a unidade básica, com uma estrutura muito simples e poucas reuniões. Também temos alas maiores, com grandes recursos organizacionais para servirmos uns aos outros. Todas as formas foram criadas dentro de programas inspirados da Igreja para ajudar os membros a “[vir] a Cristo [e ser] aperfeiçoados nele” (Morôni 10:32).

Todas essas variadas opções são iguais em valor divino, porque a doutrina do evangelho restaurado de Jesus Cristo é o mesmo em cada unidade. Testifico, como Apóstolo do Senhor Jesus Cristo, que Ele vive, que o evangelho é verdadeiro e oferece as respostas para todos os desafios pessoais e coletivos que os filhos de Deus têm nesta Terra hoje.

Neste verão, minha esposa e eu reunimo-nos com membros da Igreja em muitos países por toda a Europa. Em algumas partes da Europa, a Igreja existe há muitos anos, desde 1837. Há uma grande herança de membros fiéis naquela parte do mundo. Atualmente, temos mais de 400.000 membros naquele continente. Ao olharmos todas as gerações que emigraram da Europa para a América durante os séculos dezenove e vinte, esse número total poderia ser facilmente multiplicado algumas vezes.

Por que tantos membros fiéis deixaram seu país de origem nos primeiros anos da Igreja? Podemos citar muitas razões: para escapar da perseguição, para ajudar a edificar a Igreja na América, para melhorar suas condições econômicas, para ficar mais perto de um templo e por muitas outras razões.

A Europa ainda sente a conseqüência desse êxodo. Mas a força proveniente de várias gerações de membros fiéis da Igreja está se tornando mais visível. Vemos mais rapazes, moças e casais idosos servindo numa missão para o Senhor; vemos mais casamentos no templo; vemos mais confiança e coragem nos membros de pregar o evangelho restaurado. Entre os povos da Europa e em muitas outras partes do mundo, há um vazio espiritual causado pela falta dos ensinamentos verdadeiros de Cristo. Esse vácuo deve, pode e será preenchido com a mensagem do evangelho restaurado à medida que esses membros maravilhosos vivam e proclamem este evangelho com mais coragem e fé.

Com a expansão da Igreja na Europa, há países hoje em que a Igreja existe há menos de quinze anos. Conversei com um presidente de missão que é membro há apenas sete anos e está servindo em sua terra natal, a Rússia. Ele me disse: “No mesmo mês em que fui batizado, fui chamado como presidente de ramo”. Será que ele se sentiu sobrecarregado vez ou outra? Claro que sim! Será que ele tentou implementar o programa completo da Igreja? Felizmente não! Como ele cresceu e se fortaleceu tanto numa congregação tão pequena, em tão pouco tempo? Ele explicou: “Eu sabia com toda a minha alma que a Igreja era verdadeira. A doutrina do evangelho encheu minha mente e meu coração. Quando nos filiamos à Igreja, sentimo-nos parte de uma família. Sentimos aconchego, confiança e amor. Éramos só poucas pessoas, mas todos nós tentávamos seguir o Salvador”.

Eles deram apoio uns aos outros, fizeram o melhor que podiam e sabiam que a Igreja era verdadeira. Não foi a organização que o atraiu, mas a luz do evangelho; e essa luz fortaleceu esses membros fiéis.

Em muitos países, a Igreja ainda está começando, e a situação de suas organizações às vezes está longe de ser perfeita. Contudo, os membros podem ter um testemunho perfeito da verdade no coração. À medida que os membros ficarem em seu país e edificarem a Igreja, apesar dos problemas econômicos e das adversidades, as gerações futuras serão gratas a esses corajosos pioneiros modernos. Eles aceitaram o carinhoso convite da Primeira Presidência feito em 1999, que dizia:

“Em nossos dias, o Senhor considerou necessário prover as bênçãos do evangelho, incluindo um maior número de templos, em muitas partes do mundo. Portanto, desejamos reiterar o conselho dado há muito tempo aos membros da Igreja de que permaneçam em sua terra natal em vez de emigrarem para os Estados Unidos. (…)

Quando os membros do mundo todo permanecem em sua terra natal, trabalhando para edificar a Igreja em seu próprio país, recebem grandes bênçãos pessoais, e a Igreja é abençoada coletivamente” (Carta da Primeira Presidência, 1º de dezembro de 1999).

Deixem-me complementar com um aviso àqueles que moram em alas e estacas grandes: Temos de tomar cuidado para que o nosso testemunho não esteja centralizado na dimensão social da comunidade da Igreja, ou nas maravilhosas atividades, programas e organizações de nossas alas e estacas. Todas essas coisas são importantes e vantajosas, mas não bastam. Nem mesmo as amizades são suficientes.

Nós reconhecemos que estamos vivendo numa época de tumulto, desastres e guerra. Nós e muitos outros sentimos intensamente a grande necessidade de “uma defesa e um refúgio contra a tempestade e contra a ira, quando for derramada, sem mistura, sobre toda a Terra”. (D&C 115:6) Como encontramos um lugar de segurança como esse? O Profeta de Deus, o Presidente Gordon B. Hinckley ensinou: “Nossa segurança repousa na virtude de nossa vida. Nossa força reside em nossa retidão” (Até que nos Encontremos Novamente, A Liahona, janeiro de 2002, p. 105).

Recordem comigo como Jesus Cristo instruiu Seus Apóstolos, clara e diretamente, no começo de Seu ministério mortal: “Vinde após mim e eu vos farei pescadores de homens” (Mateus 4:19). Esse também foi o começo do ministério dos Doze Apóstolos, e suponho que eles se sentiram inadequados como eu, que também fui chamado para essa obra sagrada. Mas acho que, aqui, o próprio Salvador nos ensina uma lição sobre a doutrina básica e as prioridades da vida. Individualmente, precisamos “segui-Lo” e, se assim fizermos, o Senhor nos abençoará além de nossa própria capacidade para nos tornarmos o que Ele deseja que sejamos.

Seguir Cristo é tornar-se mais semelhante a Ele. É aprender com o Seu caráter. Como filhos espirituais do Pai Celestial, temos realmente o potencial de incorporar qualidades cristãs em nossa vida e caráter. O Salvador nos convida a aprender Seu evangelho, vivendo Seus ensinamentos. Segui-Lo é aplicar princípios corretos e, depois, testificar a nós mesmos a respeito das bênçãos que recebemos. Esse processo é muito complexo e bastante simples ao mesmo tempo. Os profetas antigos e modernos descreveram-no em três palavras: “Guardem os mandamentos” — nem mais, nem menos.

Desenvolver qualidades cristãs em nossa vida não é uma tarefa fácil, especialmente quando deixamos de lidar com situações abstratas e começamos a encarar a vida real. O teste consiste em praticar o que proclamamos. Podemos verificar nosso progresso quando essas qualidades cristãs precisam tornar-se visíveis em nossa vida — como marido ou esposa, pai ou mãe, filho ou filha, em nossas amizades, no trabalho, nos negócios e no lazer. Podemos reconhecer nosso crescimento, assim como podem as pessoas ao nosso redor, quando aumentamos nossa capacidade de “[agir] em toda a santidade diante [Dele]” (D&C 43:9).

As escrituras descrevem várias qualidades cristãs que precisamos desenvolver durante o curso de nossa vida. Isso inclui conhecimento e humildade, caridade e amor, obediência e diligência, fé e esperança. Essas qualidades de caráter independem da situação organizacional de nossa unidade da Igreja, ou de nossa condição econômica, de nossa situação familiar, cultura, raça ou idioma. As qualidades cristãs são dádivas de Deus. Elas não podem ser desenvolvidas sem Sua ajuda. A ajuda de que todos nós precisamos é concedida gratuitamente por intermédio da Expiação de Jesus Cristo. Ter fé em Jesus Cristo e em Sua Expiação significa contar plenamente com Ele — confiar em Seu poder, inteligência e amor infinitos. As qualidades cristãs surgem em nossa vida quando exercitamos nosso arbítrio de maneira correta. A fé em Jesus Cristo conduz à ação. Quando temos fé em Cristo, confiamos no Senhor o bastante para cumprir Seus mandamentos — mesmo que não compreendamos completamente as razões pelas quais eles existem. Ao buscarmos ser mais semelhantes ao Salvador, precisamos reavaliar regularmente nossa vida e confiar, pelo caminho do verdadeiro arrependimento, nos méritos de Jesus Cristo e nas bênçãos da Expiação.

Desenvolver qualidades cristãs pode ser um processo doloroso. Precisamos estar prontos para aceitar orientação e correção do Senhor e de Seus servos ungidos. Esta conferência mundial, com sua música e seus discursos, oferece força espiritual, orientação e bênçãos “do alto” (D&C 43:16). É um momento no qual a voz da inspiração e da revelação pessoal trará paz para nossa alma e nos ensinará a nos tornarmos mais semelhantes a Cristo. Essa voz será doce como a de um amigo querido e preencherá nossa alma quando nosso coração estiver suficientemente contrito.

Ao nos tornarmos mais semelhantes ao Salvador, teremos mais capacidade de “[transbordar] em esperança pela virtude do Espírito Santo” (Romanos 15:13). “[Deixaremos] as coisas deste mundo e [buscaremos] as coisas de um melhor” (D&C 25:10).

Isso me faz lembrar a analogia aerodinâmica que mencionei no começo. Falei sobre concentrar-se no básico. As qualidades cristãs são a base. Elas são os princípios fundamentais que criarão “o vento debaixo das asas”. À medida que desenvolvermos qualidades cristãs em nossa própria vida, passo a passo, elas “[nos sustentarão] como sobre asas de águias” (D&C 124:18). Nossa fé em Jesus Cristo nos dará poder e um grande impulso, nossa esperança inabalável e ativa será uma poderosa força de ascensão. Tanto a fé como a esperança nos levarão sobre oceanos de tentações e montanhas de aflições, e nos trarão em segurança de volta a nosso lar e destino eternos.

Disso testifico, em nome de Jesus Cristo. Amém.