Um Sussurro em Meu Coração
Em 1878, o Presidente John Taylor chamou os santos para reunirem-se no sul do Estado do Colorado nos Estados Unidos. No começo do século vinte, meu pai mudou-se com a família para essa terra desolada.
O solo da nova fazenda era coberto de pedras. Antes de arar a terra, tivemos que limpar o terreno. Minha mãe e eu transportamos as pedras menores num carrinho de mão, mas só havia um meio de remover as rochas: destruindo-as com dinamite.
Quando todas as pedras pequenas foram retiradas e estava na hora de começar a remover as grandes, meu pai cavou um buraco debaixo de cada uma delas, o mais profundo possível, e lá colocou a dinamite. Com todo o cuidado, posicionou os explosivos nos lugares certos para assegurar-se de que a rocha fosse totalmente destruída.
Por fim, ficou tudo pronto para que ele acendesse o pavio. Minha mãe verificou se todas as crianças estavam longe do perigo.
Bum!
A primeira rocha explodiu em centenas de fragmentos numa nuvem de poeira. Quando a poeira assentou, a rocha havia desaparecido. Tudo o que restou foi um buraco no chão e muitas pedrinhas. Meu trabalho agora era recolher os pedaços de rocha e encher o buraco com terra.
Repetimos o processo. Meu pai acendia a dinamite e eu retirava os fragmentos da rocha. Depois da terceira explosão, comecei a ficar cansado de recolher as pedras e queria fazer “o trabalho de verdade”, ou seja, acender a dinamite. Aproximei-me então de meu pai.
“Willard, saia daí!”, gritou minha mãe. Olhei para ela carrancudo. Eu tinha nove anos e achava que já era grande o suficiente para ajudar.
Quando comecei a voltar para casa, senti que estava correndo perigo. Alguma coisa me disse que algo estava errado.
Não entendi. Eu não estava em perigo. Estava longe do local da explosão. Certo de que havia imaginado aquela sensação, concentrei-me no que meu pai estava fazendo. Talvez ele visse que eu já era bem crescido e que estava pronto para trabalhar ao seu lado.
A sensação de perigo aumentou.
Lembrei-me da promessa que meu pai me fizera quando me confirmou membro da Igreja: “Eu o abençôo com poder de discernimento. Ouça o Espírito. Ele o guiará e protegerá de perigos”.
Tentei ignorar aquela voz, mas ela persistiu. Não consegui mais fingir que não ouvira o insistente sussurro.
Eu o abençôo com poder de discernimento.
As palavras foram tão claras naquele instante como na época em que meu pai pronunciou a bênção. Se eu não estava em perigo, talvez a voz estivesse me dizendo que alguém estava. Minha mãe estava pendurando a roupa no varal, minha irmã menor estava com ela, puxando-lhe a saia. No entanto, percebi que meu irmão Hyrum, de três anos, não estava por perto.
“Hyrum!” gritei. “Hyrum!” Cobrindo os olhos por causa do sol, olhei em volta, procurando-o ao longe. Então o vi, indo para o campo, as pernas gorduchas correndo o mais rápido que podiam.
Corri atrás dele, orando e gritando ao mesmo tempo. “Pai!”, berrei, balançando os braços para chamar-lhe a atenção.
Ele estava de costas. Não podia me ver nem ouvir o aviso, tampouco via Hyrum dando seus passinhos incertos, rumo ao desastre.
Consegui alcançar Hyrum bem na hora da explosão. Joguei meu corpo sobre ele e cobri-o da melhor forma que pude. Fragmentos pontiagudos de pedras voaram sobre mim, atingiram-me na cabeça, nas costas e nas pernas.
Hyrum começou a contorcer-se. “Pesado”, disse ele, “sai”.
Rolei e saí de cima dele. Eu estava todo machucado, mas não liguei. Carinhosamente, corri as mãos pelo corpo do meu irmãozinho.
“Tudo bem com você?”, perguntei.
Ele se desvencilhou de mim e ficou de pé. O queixo tremia e os olhos estavam cheios de lágrimas, mas ele não se machucou. “Medo”, balbuciou ele.
“Fiquei com medo também”, disse eu, abrançando-o.
A essa altura, meu pai já havia se aproximado de nós. As lágrimas corriam pelo rosto sujo e encardido. Os braços enormes envolveram-nos num forte abraço. “Como você percebeu que seu irmão estava em perigo?” perguntou ele.
Hesitei ao responder, não sabendo como explicar. “Uma voz me disse que algo estava errado”, disse eu. “No começo, não prestei atenção, mas ela continuou falando comigo até que eu ouvisse”. Depois confessei aquela parte que me fizera sentir culpa: “Se eu tivesse ouvido da primeira vez, Hyrum não teria saído andando por aí; jamais teria corrido perigo”.
Meu pai pousou a mão enorme no meu ombro e disse: “Mas você ouviu. Isso é que é importante”. Ele respirou fundo e completou: “O que você fez foi muito corajoso, Willard”.
“Eu orei, pai. Orei tanto que quase engasguei com as palavras”, disse eu.
“Eu também. Eu também.”
Minha mãe e minha irmã menor vieram correndo. Rindo e chorando ao mesmo tempo, ela abraçou Hyrum e a mim. Logo estávamos todos chorando e nos abraçando.
Senti uma sensação de paz muito grande ao ajoelhar-me naquela noite para orar. Minha oração foi mais longa do que de costume, pois agradeci ao Pai Celestial pelos sussurros do Espírito em meu coração.