Conferência de Mulheres da BYU
A Restauração contínua e a coligação de Israel


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A Restauração contínua e a coligação de Israel

Conferência de mulheres da Universidade Brigham Young 2020

Sexta-feira, 1º de maio de 2020

A Primeira Visão

Quando Joseph Smith se dirigiu ao bosque para orar em um dia de primavera, ele ainda não era um profeta. Até então, ele era um menino que lera a Bíblia e buscava sinceramente o evangelho. Ele estava ansioso para conhecer a vontade de Deus. Da Primeira Visão recebemos algumas mensagens importantes. Uma delas é que a condição familiar, a escolaridade, os bens materiais e a maturidade não são os requisitos que Deus considera ao decidir a quem Ele vai falar. Disso vocês já sabem, mas vamos pensar um pouco sobre a beleza daquele acontecimento. Além de não importar em que universidade seus pais estudaram, também não importa sequer se fizeram faculdade ou se sabem ler. E essas mesmas coisas tampouco importam no seu caso específico. Você está sem dinheiro? Isso não é relevante. Seu quarto é compartilhado com seus irmãos e irmãs? Não importa.

Isso soa como música para aqueles que em toda a história tiveram menos acesso à autoridade religiosa institucional. Para muitas mulheres no mundo, por exemplo, a interação com Deus tem parecido distante porque é associada em geral a homens e a ofícios no sacerdócio. Porém, a Primeira Visão e o evangelho restaurado equilibra essa concepção — Joseph Smith tinha cerca de 13 anos quando orou e não tinha sido ordenado ao sacerdócio. Em vez disso, ele era uma pessoa que aprendeu com as escrituras e que teve fé suficiente para orar e pedir respostas. Fazemos isso também. Embora não tenhamos sido chamados por Deus para restaurar a plenitude do evangelho, Deus nos chama para sermos mais eficientes, sábios e gentis — mais como nossos pais no céu.1

Além de nos ensinar que não precisamos ser importantes ou bem-sucedidas mundialmente para que Deus fale conosco, a Primeira Visão nos ensina que Deus ama a Jesus, que respondeu à oração de um menino e lhe perdoou os pecados. Porém há muito que a Primeira Visão não nos ensina. Por exemplo, ela não nos ensina sobre a Sociedade de Socorro, sobre o poder do sacerdócio, sobre o batismo ou sobre as ordenanças do templo. Ela não nos ensina sobre quantas vezes Deus responde às orações ou de que forma o faz.

Uma importante lição que a Primeira Visão de fato nos ensina sobre revelação é que ela não é o mesmo que um manual de instruções. A revelação é mais parecida com um mapa do tesouro. Minha filha desenhou um mapa do tesouro para mim e explicou que o X marca o local do tesouro e o local onde havia montanhas, um oásis e essas coisinhas no canto inferior esquerdo e no canto superior direito que podem ser árvores ou talvez algo assustador de um livro infantil. A revelação pode ser lenta, irregular e exigir interpretação. Nas palavras que ouvi pela primeira vez proferidas pela irmã Sharon Eubank: “A revelação é um processo”. Descobri que, quando nos apegamos a ela, podemos encontrar um tesouro.

Joseph Smith falou sobre o tesouro da Primeira Visão várias vezes durante sua vida a diferentes pessoas, e sou grata que ele o tenha feito. Muitas vezes um historiador conta com apenas uma fonte na qual confiar para entender o que aconteceu, mas Joseph Smith no proporcionou mais de uma maneira de compreendermos a Primeira Visão. Ele descreveu a experiência de modos diferentes em ocasiões diversas porque eram públicos diferentes e ele desejava enfatizar o que mais importava para cada público — da mesma maneira como narro uma história para meus amigos adultos de um jeito e para meus filhos de outro e ainda de outra maneira na aula de doutrina do evangelho, dependendo de como compreendo as necessidades de cada público.

Além disso, creio que Joseph Smith descreveu sua experiência sagrada de maneira diferente em diversas ocasiões porque a própria compreensão dele do ocorrido aumentou aos poucos. Quanto mais experiente ficava e quanto mais hábil se tornava no recebimento e na interpretação de revelação, mais ele entendia o que havia acontecido naquela manhã no bosque.

A revelação como um processo

A reunião em que foi estabelecida A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias ocorreu dez anos após a Primeira Visão. Quando se passa um longo tempo entre o recebimento da revelação e o seu resultado, alguns de nós podem começar a duvidar de nossa interpretação da revelação. Embora seja bom estarmos espiritualmente abertos à possibilidade de termos interpretado algo erroneamente, é também importante lembrarmos que revelação é um processo e requer tempo. Aprendi ao estudar a história da Igreja que nossos líderes têm guiado seu planejamento e suas decisões “pelo estudo e também pela fé”.2 Revelação, estudo e fé estão interligados no processo. Pode parecer que o presidente Nelson tenha anunciado muitas mudanças rápidas quando se tornou nosso profeta, mas de fato muitas dessas mudanças já estavam sendo estudadas havia muito tempo durante anos. Os líderes da igreja estudaram como essas mudanças deveria ser feitas e, em casos como o programa dominical de duas horas e o novo programa de realização dos jovens, programas-piloto já tinham sido feitos para testá-los. Resumindo, eles havia se aconselhado e orado durante anos a respeito dessas mudanças.

A revelação de 1978 para restaurar e expandir as bênçãos do templo e do sacerdócio aos membros negros da Igreja é em especial um exemplo comovente de uma revelação importante que exigiu muito tempo, reflexão e debates internos. Não sei por que exigiu tanto tempo, mas sei que, ao finalmente ser acolhida, os membros da Primeira Presidência e do Quórum dos Doze se uniram em sua celebração.

Vou agora compartilhar dois exemplos da história da Igreja que mostram como a revelação é um processo essencial e contínuo da restauração da Igreja.

Em Farmington, Utah, Aurelia Spencer Rogers, de 43 anos, notou um problema. (É ela que está à frente na imagem):

Aurelia Spencer Rogers

Os meninos eram rudes, arrogantes e obviamente não apegados ao evangelho pelo qual os mais velhos tinham sacrificado sua segurança, conforto e relacionamentos para que fossem preservados. Foi notável que, ao procurar soluções para esse problema, a irmã Rogers percebeu os sussurros de Deus e Sua aprovação e estímulo, o que a levou a buscar soluções que têm abençoado a vida dos santos dos últimos dias do mundo todo até hoje.

Primeiramente, Aurelia Rogers compartilhou suas ideias com Eliza R. Snow e com outras líderes, que gostaram delas e as descreveram para o presidente da Igreja em exercício, John Taylor. Logo ela recebeu a responsabilidade de reunir as crianças de Farmington e de criar uma organização para elas. Ao relembrar sua história, ela mais tarde descreveu como se sentiu após aceitar o chamado.

“Enquanto meditava sobre o que fazer pelo bem das crianças, pareceu-me que eu fora arrebatada pelo Espírito ou pelo menos tivera um sentimento de indescritível felicidade que durou três dias e noites. Durante esse período, nada parecia me preocupar ou me irritar; quando meus pequenos estavam irritados ou o trabalho não dava certo, eu tinha paciência e conseguia controlá-los com bondade enquanto cuidava da casa com facilidade”.3

Porém aqueles sentimentos jubilosos não eram permanentes. Ao planejar e trabalhar com as crianças, ela começou a sentir-se indigna e deprimida, de tal forma que teve dificuldades em cumprir suas responsabilidades. “Eu me dirigia às reuniões chorando, sentindo-me muito inferior; tanto que nenhum elogio que recebesse me fazia sentir incentivada ou edificada.”4

Entretanto, seus esforços culminaram com a criação da organização que hoje chamamos de Primária. Talvez vocês se perguntem, como fiz, por que ela se sentiu essa profunda tristeza enquanto realizava essa importante tarefa. Agir de acordo com a revelação e estar a serviço do Senhor não deveriam nos fazer sentir imensamente abençoadas? Esses sentimentos negativos não deveriam estar bloqueados? Isso poderia ser verdade se Adão e Eva não tivessem comido daquele fruto especial. Na vida real, não há promessa para a qual nos sintamos inspirados o tempo todo ao agir de acordo com a revelação. A vida neste mundo não é fácil. Ter um corpo físico e trabalhar com outras pessoas não é fácil, mas essas são duas das maiores razões pelas quais estamos aqui, ganhar experiência de habitar um tabernáculo mortal e trabalhar com outras pessoas e servir a elas.

Uma de minhas filhas aprendeu a dirigir recentemente. Na autoescola, ela usou um simulador antes de ser capaz de dirigir um carro de verdade. O carro de verdade é muito mais difícil de dirigir; o desafio é muito maior. No simulador, se você avançar um sinal de pare, a máquina lhe diz que você cometeu um erro e lhe dá uma segunda chance. Na vida real, se avançar um sinal de pare, você pode ferir seriamente outra pessoa. Dirigir um carro de verdade é perigoso, mas é a única forma de aprender de verdade. Viver em um corpo físico também é perigoso. As pessoas, as doenças e a nossa própria incompetência podem nos ferir — podem nos matar ou ferir de maneiras piores ainda do que a morte. Porém há lições que somente nosso corpo pode nos ensinar.

Nosso corpo pode também ser fonte de grande alegria. Para mim isso inclui o que sinto ao me exercitar para tornar meus músculos mais fortes e ter mais equilíbrio. O prazer físico inclui a experiência de cozinhar — o que é uma grande fonte de prazer para mim — uma arte criativa satisfatória e um modo de servir ao próximo. Meu corpo também me ajuda a expressar e receber afeição — abraços e beijos de quem amamos e até abraços de pessoas não tão próximas. Talvez, como eu, vocês se sintam mais conscientes das alegrias que o corpo proporciona agora que o vírus da COVID-19 as roubou temporariamente. Aprendemos tanto com as tristezas físicas quanto com as alegrias. Nossa experiência mortal também significa que um véu nos separa da presença de Deus. Embora consigamos receber revelação, às vezes as ignoramos ou as interpretamos erroneamente.

Agir em conformidade com a revelação, como para Aurelia Rogers, não garante felicidade sem obstáculos, tampouco fazer isso nos promete que todo o apoio de que precisamos aparecerá automaticamente. Ardeth Kapp, presidente geral das Moças na década de 1980, tinha experiência com isso. A irmã Kapp estava bem preparada quando foi chamada para ser presidente. Ela já tinha sido professora, tinha trabalhado no Comitê de Correlação dos Jovens e tinha servido na presidência geral das Moças. Logo que aceitou esse chamado, ela começou a receber revelação e escreveu em seu diário: “Parece-me que os céus estão se abrindo e pensamentos, orientação e sussurros do Espírito vêm a mim rápida e claramente”.5 Mesmo naquele início, ela sentiu que a organização precisava de uma declaração estatutária e um sistema de metas baseadas em valores. Mas foram precisos três anos de esforços concentrados para que o tema e os valores das Moças fossem totalmente elaborados e anunciados, e mais cinco anos até que o manual Meu Progresso Pessoal, baseado nesses valores, fosse publicado. Houve colaboração, execução e revelação adicional. Então foram dadas as aprovações.

A irmã Kapp fez um ótimo trabalho reunindo-se com outras irmãs, ela chamou pessoas capacitadas para sua equipe e elas trabalharam juntas colaborando umas com as outras. O élder Bednar ensinou que os diferentes membros de um conselho recebem diferentes partes da revelação e é necessário que cada pessoa se manifeste para que a visão se realize por completo. “As contribuições de todos os membros do conselho acrescentam elementos à inspiração”, ensinou.6 Os membros que participaram da equipe da irmã Kapp me disseram que ela foi inspirada ao chamar as pessoas para suas reuniões. Mas a colaboração eficiente leva tempo.

As mudanças no programa que a irmã Kapp supervisionou eram complicadas e ajustar os detalhes foi uma tarefa lenta. Houve longos atrasos, trabalho extra repetitivo e outras frustrações. Para o novo programa do Progresso Pessoal, ela chamou um comitê de mulheres e homens, a maioria deles casados entre si, e trabalharam juntos durante dois anos. Além do mais, a irmã Kapp foi presidente durante um período em que as líderes da Igreja não mais interagiam com a Primeira Presidência, como elas anteriormente o faziam e não servia nos comitês mais altos da Igreja, como o fazem agora. As falhas na comunicação decorrentes dessa situação exigiram mais tempo e trabalho. No entanto, o resultado foram programas que nutriram de modo eficiente as moças da Igreja por mais de 30 anos. Não eram apenas bons programas, mas todas a pessoas com as quais ela se reuniu os compreenderam bem e foram capazes de explicá-los, implementá-los e de outras maneiras apoiar as novas mudanças.

O exemplo da irmã Kapp me motiva porque, mesmo que estivessem desanimadas, elas continuaram a se reunir, exercendo fé, jejuando, orando e trabalhando arduamente. Ao ler sobre suas experiências, sinto o Espírito testificar a mim que ela agiu seguindo a revelação e que Deus magnificou seus consideráveis talentos natos por meio da colaboração mútua. Se não continuarmos a buscar a orientação do Senhor, particularmente quando encontramos dificuldades ou passamos por frustrações, poderemos menosprezar soluções inspiradas ou falharmos ao resolver problemas. Nós e outras pessoas podemos não aprender o que o Senhor nos convida a aprender.

Nossas revelações — recebê-las e registrá-las

Quero agora mudar o assunto das revelações que outros receberam para falar das nossas, especialmente sobre como nossas próprias revelações podem nos ajudar a ser melhores em ajudar as outras pessoas. Tenho perto de minha mesa uma frase que me lembra que uma boa reflexão e um bom trabalho requerem tempo e estudo cuidadoso. Essa frase é da filósofa francesa Simone Weil que refletiu muito sobre o certo e o errado e que passou por grandes sacrifícios pessoais para viver da maneira que ela considerava moralmente correta.

Weil ensinou: “Todas as traduções erradas, todos os absurdos dos problemas de geometria, todo estilo desajeitado e toda correlação errada de ideias, (…) todas essas coisas devem-se ao fato de que o pensamento se apropriou de uma ideia apressadamente e, por ser assim prematuramente encapsulada, não está aberta à verdade”.7

Para nos fazer sentir menos vulneráveis, nós humanos gostamos de definir as coisas. Em geral abraçamos uma definição rapidamente porque de posse da definição nos sentimos reconfortados e seguros. Como sugere Weil, o problema da pressa é que ela pode nos levar à conclusão errada. Creio que a descoberta apressada de uma definição possivelmente falsa e o apego firme a ela são as coisas que nos levam a alguns de nossos maiores pecados humanos, tais como a intolerância, que ergue sua repugnante face em cada nação e em todos os partidos políticos ao alimentar a incompreensão das intenções e os ataques de retaliação. A pressa exagerada pode também nos levar a ensinar um princípio falso em uma lição ou a esbravejar na mídia social de modo a ser injustos com os outros.

Por outro lado, nem tudo requer muito tempo. O perfeccionismo pode nos impedir de conseguir realizar qualquer coisa. Prestar um simples testemunho, estudar as escrituras com outra pessoa, ministrar ao próximo — essas coisas podem ser parte de um processo, não um fim perfeito. Essas coisas podem ser imperfeitas. As orações podem ser imperfeitas. Nós podemos ser imperfeitos. De fato, nesta vida tentamos ser melhor, mas não conseguimos evitar que cometamos erros. Não podemos ser perfeitos tampouco no recebimento de revelação, pois esse é um processo. Quando o perfeccionismo ameaça impedir o progresso, meu marido cita essas sábias palavras atribuídas a Voltaire: “O perfeito é inimigo do bom”. O que ele quer dizer é que o perfeccionismo pode nos paralisar e fazer com que não consigamos realizar o que é bom, que pode ser simplesmente o resultado de nossas tentativas.

Reconheço o quanto pode ser difícil não nos sentirmos aptos a receber e compreender a revelação. Há almas valorosas entre nós que obedecem e buscam — que fazem tudo certo — e ainda assim encontram dificuldades quanto a esse aspecto. Essa situação pode ser desoladora. Essas pessoas podem sentir-se indignas, embora não o sejam, e isoladas de Deus e de outros membros da Igreja. Lamento que Madre Tereza, um exemplo devoto e extraordinário de serviço e de sabedoria espiritual, sentisse por longos períodos que Deus estava distante. Em uma ocasião, ela pediu a alguém de confiança que orasse por ela, para que ela pudesse fazer a vontade de Deus embora não conseguisse ouvi-Lo: “O silêncio e o vazio são tão grandes que olho e não vejo; escuto, mas não ouço. (…) Quero que você ore por mim — para que eu permita que Ele faça a vontade Dele”.8

Então o que fazer quando sentimos que não recebemos respostas para nossas orações? Algumas pessoas que admiro profundamente estão nesse grupo, e tenho aprendido com elas ao observá-las.

Primeiro, elas reconhecem que alguns de nós têm mais facilidade em receber e compreender a revelação do que outros. Outros dons são mais naturais para elas, e elas os usam para servir a outras pessoas.

Além disso, reconhecem toda a benignidade que resulta da participação na Igreja. Enxergam a bela vida e os relacionamentos que a Igreja proporciona. Elas confiam na sua benignidade. Continuam a servir, orar, jejuar e ler as escrituras, mesmo quando não têm fortes sentimentos espirituais.

E por fim, são humildes. Reconhecem os momentos em que sentiram a influência do poder divino, ainda que pequena. Em vez de reclamar por não terem mais, apreciam o que já têm.

Quero também adicionar uma observação de esperança aqui. Quando serviram em suas respectivas presidências gerais da Sociedade de Socorro, Sheri Dew e Julie Beck ensinaram que a revelação é uma habilidade que podemos desenvolver. Acredito que isso é verdade. Tenho observado um amigo que pensa não possuir o dom da revelação pessoal, mas que serve generosamente de qualquer forma. Vejo que pensamentos lhe chegam cada vez mais para que aja de certa maneira. Ele aprendeu a confiar nesses pensamentos, mesmo quando não tem certeza de que sejam revelações pessoais. Ele age com fé e, como resultado, aproxima-se de Deus. Sua vida e a de muitos outros têm sido engrandecidas por seu desejo de tentar.

Outra amiga escreveu a mim:

“Não vivencio revelações como sentimentos de consolo ou certeza e é raro que sejam discernimentos ou respostas que me vêm à mente. Entretanto, já tive intensas experiências ao conhecer algumas pessoas e receber forte impressão em meu coração de que era responsável por oferecer-lhes amor, carinho e amizade. Tais momentos são poderosos e as impressões são persistentes. Acabei por reconhecê-las como revelação.”9

Essas trajetórias que acabei de descrever não são minhas. Um dos grandes tesouros da minha vida é o dom da revelação pessoal. Mesmo assim, esse dom falha e oscila. Em certas semanas recebo inspiração durante minhas orações para lembrar-me e agir. Em outras, isso não acontece. Às vezes recebo menos porque faço perguntas vagas ou porque não ouço. Outras vezes não pergunto nem ouço adequadamente, mas recebo orientação assim mesmo. E há ainda períodos em que Deus deseja que eu resolva as coisas por mim mesma. Em todos esses estágios, sei que quando falho, posso me arrepender e que Deus vai perdoar e também compensar as outras pessoas pelos meus erros. Confio que Deus é o arquiteto do produto final. Como meu amigo Daryl Hoole diz: “Estas são apenas batalhas. Deus já venceu a guerra”.

Em virtude de nossa participação na Sociedade de Socorro, somos chamadas a instruir, inspirar e curar. Como seria possível Deus não desejar comunicar-Se conosco se Ele precisa que façamos esta obra? Nem todos temos as habilidades de compreender facilmente a revelação, mas creio que mesmo os que lutam para obter revelação pessoal podem se aproximar mais de Deus no processo de executar um bom trabalho.

A revelação e a coligação de Israel

Vamos agora falar um pouco sobre a relação entre revelação e a coligação de Israel. O presidente Nelson vem incentivando os jovens e a nós a participar da coligação de Israel.10 Para mim, a coligação de Israel significa uma bênção para todo o mundo e também para os membros da Igreja e membros em potencial. As irmãs, nos primórdios da Sociedade de Socorro, acreditavam que Joseph Smith, quando, em nome de Deus, abriu as portas para as mulheres, tornou possível coisas como a convenção de Seneca Falls, que foi a primeira convenção de direitos das mulheres nos Estados Unidos. Elas acreditavam que ao abrir as portas e prometer que “esta Sociedade se regozijará e conhecimento e inteligência fluirão a partir de então — este é o início de melhores dias”,11 as condições melhorariam para as mulheres em todo o mundo, não só para elas mesmas. Quando ouvi dizer pela primeira vez no que elas acreditavam, achei pitoresco e meigo. Mas ao compreender melhor a situação, vim a concordar com elas. De forma similar, creio que quanto mais santos nos tornarmos, mais poderemos abençoar as pessoas de fora da Igreja, bem como os membros. E podemos estar abertas para as boas coisas que as pessoas de fora da Igreja têm para nos ensinar.

Passagens escritas pelo profeta Néfi no Livro de Mórmon têm me ajudado a ter uma visão melhor do significado da coligação de Israel. Néfi descreve a época da coligação a partir da perspectiva dos mortais: “E ele reúne seus filhos dos quatro cantos da Terra; e ele conta suas ovelhas e elas conhecem-no e haverá um rebanho e um pastor; e alimentará suas ovelhas e nele serão apascentadas.”12 Amo a imagem de todos nós, de todas as partes da Terra, reunidos em uma pastagem sob os olhares do único pastor perfeito e amoroso. Existe um local de pastagem que amo e que visito todo verão. Cavalos, vacas e cervos pastam lá. O céu, as montanhas, o prado, as árvores e os regatos são belos. O ar é límpido. Os animais têm tudo o que necessitam e estão seguros ali. Ter todos nós em um lugar seguro e belo, onde somos conhecidos, vistos e cuidados — quero estar nesse lugar e quero ajudar outras pessoas a encontrá-lo.

A revelação é fundamental para a coligação de Israel. Procurar fazer a vontade de Deus — tanto pelo que vem por meio dos nossos líderes quanto a nós individualmente — é a maneira pela qual podemos encontrar pastagens e ajudar outras pessoas a fazê-lo também. Construir pontes com pessoas de outros países além daquele onde nasci — especialmente, mas não exclusivamente, quando fui missionária na Rússia— tem sido uma das experiências mais significativas da minha vida. Observar o amor de Deus por meio do Espírito Santo transcender as barreiras linguísticas e culturais enche-me de esperança. Esse milagre me faz pensar que cada coisa boa é possível. Fortalece a minha fé nas palavras de Néfi que vêm alguns versículos à frente dos que já li, nos quais ele antevê que para os que se arrependem: “Todas as nações, tribos, línguas e povos habitarão em segurança no Santo de Israel”.13 Anseio por ver todos nós vivendo em segurança no Santo de Israel. E essa promessa me motiva a buscar revelação para poder contribuir com o processo e ajudar mais de nós a encontrar as pastagens de Jesus.

Histórias sobre revelação

De alguma forma, a maneira como a história é contada nos leva a entender errado o funcionamento da revelação. Houve um longo período na história americana em que pensávamos que o que era útil era nos dar pessoas para venerar. Aprendemos a contar histórias que continham somente o que era admirável. Isso afetava a maneira como contávamos as histórias da Igreja também — nós a tornávamos mais organizada e fazíamos as pessoas mais simples e fáceis de se entender, o que não era real. Os próprios registros nem sempre são organizados. Nós, do Departamento de História da Igreja, estamos tentando narrar as histórias de pessoas reais com todas as suas complexidades e a reconhecer momentos em que nem tudo era perfeito. Ao fazer isso, estamos construindo uma compreensão mais completa dos acontecimentos passados. Algumas pessoas gostam dessa mudança. Para outros, isso cria desafios dolorosos. Apesar da dor dessa transição, pela qual me entristeço, creio que é o que se deve fazer. Pouquíssimas horas depois que a Igreja foi organizada, Deus nos mandou manter registros. Deus não disse aos líderes da Igreja para registrar somente os bons momentos ou as ações dos membros que eram 100 por cento corretas. Uma vez que somos humanos, tal registro histórico seria muito breve.

Acho a história da Igreja inspiradora porque vejo nela o amor de Deus — continuamente — e também vejo pessoas que amam a Deus e são muito criativas. A história da Igreja coloca histórias reais em meu coração. Assim como a história da minha tetravó, cujo marido a abandonou várias vezes e depois definitivamente, mas que criou os filhos, atravessou as planícies e serviu como presidente do conselho feminino de saúde nos primórdios da história de Utah, em que ela compartilhou uma receita de remédios que ela recebeu em uma visão.

A história da Igreja inclui a história de um descendente dela, meu pai, que fez boas e más escolhas. Apesar de fazer más escolhas continuamente quando as coisas estavam ruins, parte dele continuava a tentar fazer boas escolhas. Ele me fazia telefonemas estranhos uma ou duas vezes por ano. Seus privilégios do sacerdócio e do templo lhe foram restaurados pouco antes de sua morte. A chama da minha própria coragem se fortalece quando penso na coragem que ele precisou reunir para essas reintegrações e para fazer os telefonemas para a filha que ele havia abandonado quando ela tinha seis semanas de vida. Apesar de todos os erros que cometeu, sinto que devo honrá-lo pelas coisas difíceis que ele fez corretamente. A história dele não é bonita, mas além de me advertir, ela também me inspira.

Conclusão

Adotar a visão da revelação como um processo requer paciência e esperança. Por definição, esperança é algo que temos apesar das experiências passadas negativas ou das evidências que indicam o contrário. A esperança é algo que decidimos ter. Quando sentimos que os problemas do mundo nos agridem de forma aguda, podemos gastar toda a nossa energia na raiva e na crítica ou podemos estudar, orar a respeito e decidir ter esperança na solução que virá, em nosso papel como parte da solução. A crítica é vital para o bom raciocínio, mas creio que devemos equilibrá-la com esperança e com ação positiva. Podemos manter essa esperança à nossa frente para iluminar o caminho para nós e para os outros.

Essa imagem tem sido significativa para mim há muito tempo.

Mulheres Responsáveis, de James Christensen

Quando eu estava no centro de treinamento missionário, minha amiga Laura recortou-a de um catálogo, colou-a em uma placa de isopor e a enviou para mim. Eu a levava para todo lado. Um ou dois anos depois de minha missão, minha amiga Emilee achou uma versão maior e pediu a seu marido, que é artista, para emoldurá-la como presente de Natal para mim. Ela está exposta em minha casa desde essa época.

Observem quantas coisas estão atadas a ela para que não caiam. Uma delas é um bebê. Uma outra é uma corda. Outra é um instrumento musical. Fico pensando se essa vela é a razão pela qual ela pode voar. Imaginem-se como se fossem essa mulher? O que está atado ao seu corpo? Ao meu estão atados três filhas e um marido, mas eles também me ajudam, por isso talvez estejamos todos atados com cordas que se expandem. Levo sempre comigo uma caneta e papel. Livros. Uma salada para ofertar. Uma pá de jardinagem. O bebê de alguém, porque gosto de ajudar jovens mães. Uma lista de pessoas por quem orar. Um aspirador de pó. Uma pasta de escrever a ser preenchida. A receita de panquecas suecas de Esther Ackerberg. Para você, o que seria a chama que você segura? Para mim, essa vela é a esperança e todas as coisas que compõem essa esperança: o evangelho de Jesus Cristo restaurado por Joseph Smith, entrelaçado com a instituição da Igreja por cada profeta desde então; experiências das mulheres da Igreja nos últimos 200 anos; meus antepassados, meus amigos; e vocês. O fogo é contagioso e as chamas dos outros mantêm a minha chama acesa.

Podemos fazer um bem substancial no mundo, não porque seja simples, mas porque somos fortes o bastante para fazer coisas difíceis. Nosso Pai Celestial está esperando para nos ajudar, para nos fazer mais fortes. Ele precisa que façamos as coisas de acordo com as respostas às perguntas que Ele espera que façamos.14 Irmãs, somos investidas com o poder do Deus. Vamos exercer esse poder de iluminar o mundo como o amor de Deus. Em nome de Jesus Cristo. Amém.

Notas

  1. “Nossa teologia começa com genitores celestiais. Nossa mais elevada aspiração é ser como eles.” (Dallin H. Oaks, “Apostasia e restauração”, A Liahona, julho de 1995, p. 89).

  2. Doutrina e Convênios 88:118.

  3. Aurelia Spencer Rogers, Life Sketches of Orson Spencer and Others, and History of Primary Work, 1898, p. 212.

  4. Rogers, p. 214.

  5. Ardeth G. Kapp e Carolyn J. Rasmus, entrevista dada a Gordon Irving, 1992, p. 41, Biblioteca de História da Igreja, Salt Lake City.

  6. David A. Bednar, em “Painel de debate” (Reunião Mundial de Treinamento de Liderança, novembro de 2010), ChurchofJesusChrist.org.

  7. Simone Weil, Waiting on God, 2009, p. 35.

  8. David Van Biema, “Mother Teresa’s Crisis of Faith”, Time, 23 de agosto de 2007, time.com.

  9. E-mail para Kate Holbrook, 17 de abril de 2020.

  10. “Faço uma súplica profética a vocês, mulheres da Igreja, para que moldem o futuro ao ajudar na coligação da Israel dispersa.” (Russell M. Nelson, “A participação das irmãs na coligação de Israel,” Liahona, novembro de 2018, p. 69); “Meus queridos e extraordinários jovens, vocês foram enviados à Terra nesta época específica, a época mais importante da história do mundo, a fim de ajudarem na coligação de Israel” (Russell M. Nelson, “Juventude da Promessa” [devocional mundia para os jovens, 3 de junho de 2018], ChurchofJesusChrist.org); “Compilamos gráficos de linhagem, criamos folhas de grupo familiar e fazemos o trabalho vicário no templo para coligar pessoas ao Senhor e a suas respectivas famílias” (Russell M. Nelson, “A Coligação da Israel dispersa,” Liahona, novembro de 2006, pp. 80–81).

  11. “Livro de Atas da Sociedade de Socorro de Nauvoo”, p. 40, josephsmithpapers.org.

  12. 1 Néfi 22:25.

  13. 1 Néfi 22:28.

  14. “Não creio que Deus Se sinta insultado quando nos esquecemos Dele. No entanto, acho que Ele fica profundamente decepcionado. Ele sabe que nos privamos da oportunidade de ser atraídos a Ele quando não nos lembramos Dele e de Sua bondade. E com isso, perdemos a oportunidade de Ele Se aproximar de nós e de receber as bênçãos específicas que Ele prometeu” (Dale G. Renlund, “Ponderar sobre a bondade e a grandiosidade de Deus,” Liahona, maio de 2020, p. 44).