2010–2019
Ser Genuínos
Abril 2015


17:51

Ser Genuínos

É minha oração (…) que (…) resistamos à tentação de chamar a atenção para nós mesmos e, em vez disso, esforcemo-nos para alcançar uma honra bem maior: a de tornar-nos humildes e genuínos discípulos de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo.

No final do século 18, Catarina, a Grande, da Rússia, anunciou que viajaria para a região sul de seu império, acompanhada de vários embaixadores estrangeiros. O governador da região, Grigory Potemkin, queria desesperadamente impressionar aqueles visitantes. E assim, empenhou-se ao máximo para exibir as realizações do país.

Durante parte da viagem, Catarina navegou pelo Rio Dnieper, apontando orgulhosamente para os embaixadores as prósperas aldeias ao longo da margem, repletas de aldeões trabalhadores e felizes. Havia um único problema: tudo era para efeito de aparência. Dizem que Potemkin mandou construir fachadas de papelão de lojas e casas. Até posicionou camponeses parecendo atarefados para dar a impressão de uma economia próspera. Depois que a comitiva desaparecia na curva do rio, os homens de Potemkin empacotavam a aldeia falsa e corriam até outro lugar rio abaixo a fim de prepararem-se para a passagem seguinte de Catarina.

Embora os historiadores modernos tenham questionado a veracidade dessa história, o termo “Aldeia Potemkin” entrou para o vocabulário do mundo. Agora ele se refere a qualquer tentativa de fazer com que os outros acreditem que somos melhores do que realmente somos.

Será Que Nosso Coração Está no Devido Lugar?

Faz parte da natureza humana querer mostrar o melhor de nós. É por isso que muitos de nós trabalham tão arduamente na parte externa de nossa casa, e é por isso que nossos jovens irmãos do Sacerdócio Aarônico tanto cuidam para que cada fio de cabelo esteja no lugar certo, só para o caso de encontrarem alguém especial. Nada há de errado em engraxar os sapatos, perfumar-se ou até esconder a louça suja antes que cheguem os mestres familiares. No entanto, levado ao extremo, esse desejo de impressionar pode passar de algo útil para algo enganador.

Os profetas do Senhor sempre ergueram a voz de advertência contra aquele que “se aproxima [do Senhor], e com a sua boca, e com os seus lábios [O] honra, mas o seu coração se afasta para longe [Dele]”.1

O Salvador foi compreensivo e compassivo com os pecadores cujo coração era humilde e sincero. Mas agiu com justa ira contra os hipócritas, como os escribas, os fariseus e os saduceus — aqueles que tentaram parecer justos para conquistar o louvor, a influência e a riqueza do mundo, tudo isso enquanto oprimiam as pessoas que eles deveriam abençoar. O Salvador os comparou “aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundície”.2

Em nossos dias, o Senhor tem palavras igualmente fortes para os portadores do sacerdócio que tentam “encobrir [seus] pecados ou satisfazer [seu] orgulho, [ou sua] vã ambição”. Quando fazem isso, disse Ele, “os céus se afastam; o Espírito do Senhor se magoa e, quando se afasta, amém para o sacerdócio ou a autoridade desse homem”.3

Por que isso acontece? Por que às vezes tentamos parecer ativos, prósperos e dedicados por fora quando por dentro — como o Salvador disse a respeito dos efésios — “[deixamos] o [nosso] primeiro amor”?4

Em alguns casos, podemos simplesmente ter deixado de nos concentrar na essência do evangelho, confundindo a “aparência de religiosidade” com o “seu poder”.5 Isso é particularmente perigoso quando direcionamos nossas expressões externas de discipulado no sentido de impressionar as pessoas em benefício próprio ou para obter influência. É nesse momento que corremos o risco de entrar em território fariseu, estando mais do que na hora de examinar nosso coração para fazer imediatas correções de direção.

Programas Potemkin

Essa tentação de parecer melhores do que somos não ocorre apenas em nossa vida pessoal, mas também em nossas designações da Igreja.

Conheço, por exemplo, uma estaca cujos líderes estabeleceram metas ambiciosas para o ano. Embora todas as metas parecessem dignas, eles se concentraram em declarações imponentes e impressionantes ou em números e porcentagens.

Depois que essas metas foram debatidas e aceitas, algo começou a preocupar o presidente da estaca. Ele pensou nos membros de sua estaca — como a jovem mãe com filhos pequenos que ficara viúva recentemente. Pensou nos membros que se debatiam com dúvidas e solidão ou com graves condições de saúde, sem ter seguro médico. Pensou nos membros que estavam às voltas com um casamento desfeito, vícios, desemprego e doença mental. E quanto mais pensava neles, mais se perguntava com humildade: Será que nossas novas metas fazem alguma diferença na vida desses membros?

Começou a questionar se as metas de sua estaca teriam sido diferentes se eles tivessem primeiro perguntado: “Qual é o nosso ministério?”

Então, aquele presidente de estaca voltou a seus conselhos, e juntos eles mudaram de enfoque. Decidiram que não permitiriam que “os famintos e os necessitados e os nus e os enfermos e os aflitos [passassem por eles], sem notá-los”.6

Estabeleceram novas metas, reconheceram que o sucesso nessas novas metas nem sempre poderia ser medido, ao menos não pelo homem — pois como alguém mede o testemunho pessoal, o amor de Deus ou a compaixão pelos semelhantes?

Mas também sabiam que “muitas coisas que podemos contar não contam. Muitas coisas que não podemos contar realmente contam”.7

Pergunto-me se nossas metas organizacionais e pessoais não são muitas vezes versões modernas de uma aldeia Potemkin. Será que elas parecem impressionantes à distância, mas deixam de abordar as necessidades reais de nossos amados semelhantes?

Meus queridos amigos e companheiros portadores do sacerdócio, se Jesus Cristo Se reunisse conosco e pedisse que prestássemos conta de nossa mordomia, não sei bem se Ele Se concentraria tanto em programas e estatísticas. O que o Salvador deseja saber é a condição de nosso coração. Ele deseja saber como amamos e ministramos àqueles que estão sob nossos cuidados, como demonstramos nosso amor a nosso cônjuge e à família e como aliviamos sua carga diária. E o Salvador deseja saber como você e eu nos achegamos a Ele e a nosso Pai Celestial.

Por Que Estamos Aqui?

Pode ser útil analisar nosso próprio coração. Podemos perguntar-nos, por exemplo, por que servimos na Igreja de Jesus Cristo?

Poderíamos até perguntar: Por que estamos aqui nesta reunião hoje?

Suponho que, se eu fosse responder a essa pergunta de maneira superficial, poderia dizer que estou aqui porque o Presidente Monson me designou a discursar.

Portanto, eu realmente não tinha escolha.

Além disso, minha mulher, a quem amo muito, esperava que eu estivesse presente. E como eu poderia dizer não a ela?

Mas todos sabemos que há motivos melhores para participar de nossas reuniões e conduzir a vida como discípulos comprometidos de Jesus Cristo.

Estou aqui porque desejo de todo o coração seguir meu Mestre Jesus Cristo. Anseio em fazer tudo o que Ele me pedir nesta grande causa. Desejo muito ser edificado pelo Espírito Santo e ouvir a voz de Deus quando Ele falar por meio de Seus servos ordenados. Estou aqui para me tornar um homem melhor, para ser elevado pelos exemplos inspiradores de meus irmãos e minhas irmãs em Cristo, e para aprender a ministrar mais eficazmente aos necessitados.

Em resumo, estou aqui porque amo meu Pai Celestial e Seu Filho Jesus Cristo.

Estou certo de que esse é seu motivo também. É por isso que estamos dispostos a fazer sacrifícios e não apenas declarações de que vamos seguir o Salvador. É por isso que portamos com honra Seu santo sacerdócio.

De Fagulha a Fogueira

Quer o seu testemunho seja forte e saudável, quer a sua atividade na Igreja seja mais semelhante a uma aldeia Potemkin, a boa nova é que vocês podem crescer a partir de qualquer ponto em que estejam. Aqui na Igreja de Jesus Cristo, podemos amadurecer espiritualmente e achegar-nos ao Salvador, aplicando princípios do evangelho dia a dia.

Com paciência e persistência, até os menores atos de discipulado ou a minúscula brasa de crença podem tornar-se uma ardente fogueira de vida consagrada. De fato, é assim que a maioria das fogueiras começa — com uma simples fagulha.

Portanto, caso se sintam pequenos e fracos, simplesmente se acheguem a Cristo, que faz com que as coisas fracas se tornem fortes.8 Os mais fracos dentre nós, pela graça de Deus, podem tornar-se fortes espiritualmente, porque Deus “não faz acepção de pessoas”.9 Ele é nosso “Deus fiel, que guarda a aliança e a misericórdia (…) aos que o amam e guardam os seus mandamentos”.10

Tenho a convicção de que, se Deus pôde estender a mão e dar alento a um pobre refugiado alemão de uma modesta família de um país devastado pela guerra do outro lado do mundo, muito distante da sede da Igreja, então Ele pode estender a mão para vocês.

Meus amados irmãos em Cristo, o Deus da Criação, que soprou o fôlego da vida no Universo, sem dúvida tem o poder de soprar o fôlego da vida em vocês. Sem dúvida, Ele pode torná-los o genuíno e espiritual ser de luz e verdade que vocês desejam se tornar.

As promessas de Deus são certas e seguras. Podemos ser perdoados de nossos pecados e purificados de toda iniquidade.11 E se continuarmos a abraçar e a viver princípios verdadeiros em nossas circunstâncias pessoais e em nossa família, chegaremos no final a um ponto em que “nunca mais [teremos] fome, nunca mais [teremos] sede. (…) Porque o Cordeiro que está no meio do trono [nos] apascentará, e [nos] servirá de guia para as fontes das águas da vida; e Deus limpará de [nossos] olhos toda a lágrima”.12

A Igreja É um Lugar para Curar-se, e Não para Se Esconder

Mas isso não pode acontecer se nos escondermos atrás de fachadas pessoais, dogmáticas ou organizacionais. Esse discipulado artificial não apenas nos impede de vermos a nós mesmos como realmente somos, mas também de mudarmos verdadeiramente por meio do milagre da Expiação do Salvador.

A Igreja não é um salão de exposição de automóveis — um lugar para nos colocar à mostra para que outros possam admirar nossa espiritualidade, nossa capacidade ou nossa prosperidade. É mais como uma oficina mecânica, na qual os veículos que necessitam de conserto vão para manutenção e reparos.

E acaso não estamos, todos nós, necessitando de reparos, manutenção e reformas?

Vamos à igreja não para esconder nossos problemas, mas para curá-los.

E como portadores do sacerdócio, temos uma responsabilidade adicional — a de “[apascentar] o rebanho de Deus, (…) não por força, mas voluntariamente; nem [para benefício próprio], mas de ânimo pronto; nem como tendo domínio sobre a herança de Deus, mas servindo de exemplo ao rebanho”.13

Lembrem-se, irmãos: “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes”.14

O maior, o mais capaz e o mais perfeito homem que já andou na Terra também foi o mais humilde. Ele realizou alguns de Seus atos de serviço mais impressionantes em particular, com apenas poucos observadores, aos quais Ele pedia que “a ninguém dissessem” o que Ele havia feito.15 Quando alguém O chamava de “bom”, Ele rapidamente refutava o cumprimento, insistindo que somente Deus era verdadeiramente bom.16 Fica claro que o louvor do mundo nada significava para Ele. Seu único propósito era o de servir a Seu Pai e “[fazer] sempre o que (…) agrada [ao Pai]”.17 Bem faríamos em seguir o exemplo de nosso Mestre.

Amemos Como Ele Amou

Irmãos, esse é nosso elevado e santo chamado — ser agentes de Jesus Cristo, amar como Ele amou, servir como Ele serviu, “[erguer] as mãos que pendem e [fortalecer] os joelhos enfraquecidos”,18 “[cuidar] dos pobres e necessitados”,19 e cuidar das viúvas e dos órfãos.20

É minha oração, irmãos, que, ao servirmos em nossa família, em nosso quórum, em nossa ala, estaca, comunidade e nação, resistamos à tentação de chamar a atenção para nós mesmos e, em vez disso, esforcemo-nos para alcançar uma honra bem maior: a de tornar-nos humildes e genuínos discípulos de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. Ao fazermos isso, estaremos trilhando o caminho que nos leva a tornar-nos melhores, mais genuínos e mais nobres. Presto testemunho disso em nome de nosso Mestre, Jesus Cristo. Amém.