Cinco Pães e Dois Peixes
Uma das principais razões de esta Igreja ter crescido ( … ) até alcançar sua força atual, é a fidelidade e devoção de milhões ( … ) que têm somente cinco pães e dois peixinhos para oferecer no serviço do Mestre.
Venho perante vós, meus irmãos e amigos, com a sincera esperança de que me oferecereis vossa fé e orações enquanto procuro, nos próximos minutos, reconhecer a mão do Senhor em nossa vida.
Estendo à Irmã Norma Ashton nosso amor e orações pelo falecimento de nosso amado companheiro, Élder Marvin J. Ashton, do Quórum dos Doze Apóstolos.
Há alguns meses, Élder Spencer J. Condie e eu estávamos no aeroporto da Cidade do Lago Salgado quando, inesperadamente, encontramos um casal devotado e fiel, amigo nosso há vários anos. Humilde, fiel e eficientemente, esse casal tem passado a vida tentando edificar a Igreja em diferentes locais do mundo. Élder Condie observou: “Não é notável o que pessoas com cinco pães e dois peixes fazem para construir o reino de Deus?” Esse tipo de serviço silencioso e devotado é, para mim, com certeza, o cumprimento da palavra de Deus, que diz: “Para que a plenitude do meu evangelho seja proclamada pelos fracos e humildes aos confins do mundo, e diante de reis e governadores”. (D&C 1:23.) Hoje gostaria de falar a respeito daqueles, entre nós, que podem oferecer ao Salvador talento equivalente apenas a cinco pães e dois peixes para alimentar a multidão.
“Então Jesus, levantando os olhos, e vendo que uma grande multidão vinha ter com ele, disse a Felipe: Onde compraremos pão para estes comerem?
Mas dizia isto para o experimentar; porque ele bem sabia o que havia de fazer.” (João 6:5-6.)
Felipe rapidamente respondeu que não havia dinheiro suficiente para comprar pão para tanta gente. Então André, irmão de Pedro, disse: “Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos” (v. 9).
“E, tomando ele os cinco pães e os dois peixes, levantou os olhos ao céu, abençoou e partiu os pães, e deu-os aos seus discípulos para que os pusessem diante deles. E repartiu os dois peixes por todos;
E todos comeram, e ficaram fartos.
E levantaram doze cestos cheios de pedaços de pão e de peixe.
E os que comeram os pães eram quase cinco mil homens.” (Marcos 6:41-44.)
Posteriormente, tornaram-se insensíveis, tendo eles esquecido a divina missão de Jesus, “pois não tinham compreendido o milagre dos pães” (v. 52).
Em nossos dias, parece que nos esquecemos do milagre dos cinco pães e dois peixes, trocando-os pelos milagres realizados pela mente e mão do homem. Refiro-me às maravilhas do transporte moderno e à crescente sofisticação que acompanha o conhecimento científico, incluindo o novo sistema de transmissão eletrônica. Esquecemo-nos de que este espantoso conhecimento chega à humanidade apenas quando Deus decide revelá-lo e deveria ser usado para propósitos mais nobres e sábios do que o simples entretenimento. Os recursos modernos permitem que as palavras dos profetas sejam retransmitidas por satélites na órbita da Terra e cheguem aos ouvidos de boa parte da humanidade.
Esse grande conhecimento traz consigo certo ceticismo quanto às simples e profundas verdades eternas ensinadas no milagre dos pães e dos peixes: que Deus governa nos céus e na Terra por meio de sua infinita inteligência e bondade.
Devemos ainda entender e lembrar-nos de que nós também, como o jovem citado no relato do Novo Testamento, somos filhos espirituais do Pai Celestial, que Jesus é o Cristo, nosso Salvador e o Redentor do mundo. Acreditamos que nos séculos que se seguiram ao estabelecimento de Seu reino na Terra, as doutrinas e ordenanças foram mudadas, resultando na apostasia e perda das chaves da autoridade do sacerdócio na Terra. Um milagre até maior que o dos pães e dos peixes aconteceu quando o Profeta Joseph Smith viu o Pai e o Filho no Bosque Sagrado, perto de Palmyra, Estado de Nova York. Posteriormente, as chaves, o sacerdócio e as ordenanças de salvação foram restauradas em sua plenitude e a igreja de Cristo foi restabelecida em nossos tempos. Assim, Deus novamente nos “alimentou” e fez transbordar nossos “cestos”.
Diz-se que esta Igreja não atrai necessariamente os grandes homens, mas muitas vezes transforma pessoas simples em grandes. Muita gente anônima com dons equivalentes apenas a cinco pães e dois peixes magnificam seus chamados e servem sem receber atenção ou reconhecimento, literalmente alimentando a muitos. Em larga escala, eles realizam o sonho de Nabucodonosor de que o evangelho nos últimos dias seria como uma pedra cortada da montanha, sem mãos, rolando adiante até encher toda a Terra (ver Dan. 2:34-35; D&C 65:2). São as centenas de milhares de líderes e professores de todas as organizações auxiliares e quóruns do sacerdócio, os mestres familiares, as professoras visitantes da Sociedade de Socorro. São os vários bispos humildes da Igreja, muitos sem educação formal, mas grandemente magnificados, sempre aprendendo, com o humilde anseio de servir ao Senhor e às pessoas das alas.
Qualquer homem ou mulher que se deleita com o toque do Mestre é como barro de oleiro em Suas mãos. Mais importante do que conseguir fama e fortuna é ser o que Deus quer que sejamos. Antes de virmos a esta Terra, podemos ter sido preparados para fazer, nesta vida, um bem, talvez pequeno, mas que ninguém mais poderia fazer. O Senhor disse a Jeremias: “Antes que te formasse no ventre te conheci, e antes que saísses da madre te santifiquei: às nações te dei por profeta”. (Jer. 1:5.) Se o Senhor tem um trabalho para as pessoas de muitos talentos, acredito que também tenha um trabalho importante para as de poucos talentos.
Qual a característica central daqueles que têm apenas cinco pães e dois peixes? O que lhes torna possível, pelo toque do Mestre, servir, edificar e abençoar centenas e até milhares de pessoas? Após toda uma vida lidando com problemas de homens e mulheres, acredito que essa característica seja a capacidade de vencer o ego e o orgulho—ambos adversos à presença plena do Espírito de Deus e à humildade perante Ele. O ego interfere quando marido e mulher precisam pedir perdão um ao outro. Evita que se desfrute toda a doçura de um amor profundo. O ego freqüentemente impede que pais e filhos se entendam totalmente. Aumenta nossa presunção e nosso convencimento. Cega-nos para a realidade. O orgulho impede-nos de confessar pecados e imperfeições ao Senhor e de buscar o arrependimento.
Que dizer das pessoas que têm talentos apenas equivalentes a dois pães e um peixe? Elas realizam boa parte do trabalho árduo, inferior, sem desafios e mal remunerado do mundo. A vida pode não ter sido exatamente justa para com eles. Eles lutam a fim de conseguir o bastante para manter corpo e alma unidos. Não são, porém, esquecidos. Caso seus talentos sejam usados para construir o reino de Deus e servir ao próximo, eles desfrutarão todas as promessas do Senhor. A grande promessa do Salvador é de que eles “[receberão] a sua recompensa, sim, paz neste mundo e vida eterna no mundo vindouro”. (D&C 59:23.) Aquele que recebeu apenas dois talentos pôde dizer: “Senhor, entregaste-me dois talentos; eis que com eles granjeei outros dois talentos”. Disse-lhe o Senhor: “Bem está, bom e fiel servo. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor”. (Mat. 25:22-23.)
Para alguns, é uma bênção receber faculdades mentais e talentos equivalentes a quinze pães e dez peixes. Eles têm muito a contribuir; outros, porém, tornam-se menos do que poderiam ser. Não atingem todo o seu potencial para servir, talvez porque tenham muito orgulho daquilo que pensam que sabem e do que possuem. A pessoa que é assim não parece disposta ou capaz de ceder “ao influxo do Espírito Santo, … chegando a ser como criança, submisso, manso, humilde, paciente, cheio de amor e disposto a se submeter a tudo quanto o Senhor achar que lhe deve infligir, assim como uma criança se submete a seu pai”. (Mosiah 3:19.)
Durante boa parte de minha vida, tenho ouvido alguns jornalistas e dissidentes predizerem a iminente derrocada da Igreja. Eles freqüentemente apontam o pretenso descontentamento da juventude da Igreja. A vida e a dedicação dos quase 50.000 jovens missionários são testemunho suficiente da fidelidade de muitos de nossos jovens. Além disso, no decorrer de minha vida, o número de membros da Igreja cresceu de 525.000 para mais de 8.500.000. Eu acredito que isso se deva à restauração da plenitude das chaves e da autoridade do evangelho de Cristo por meio de Joseph Smith. Disso presto testemunho.
Recentemente, um jornalista de outro estado disse que estavam aparecendo “rachaduras nas paredes do templo”, falando, é claro, figurativamente. Com isso eu suponho que ele tenha pretendido dizer que os alicerces da Igreja estavam sendo abalados por um número muito pequeno de membros que não apóiam completamente os líderes ou que não guardam os convênios da Igreja. Para eliminar essa idéia de rachaduras na fé de nossos membros, devemos simplesmente observar o alegre povo que freqüenta qualquer um de nossos quarenta e cinco templos em todo o mundo. Muitos são casais de mãos dadas, carregando suas pequenas sacolas, outros são solteiros em busca das pacíficas bênçãos da casa do Senhor. Seus semblantes refletem grande alegria e satisfação.
Uma das principais razões de esta Igreja ter crescido, de seu humilde começo para sua força atual, é a fidelidade e devoção de milhões de pessoas humildes e fervorosas que têm apenas cinco pães e dois peixinhos para oferecer, no serviço do Mestre. Elas renunciam a seus próprios interesses e, fazendo isso, encontram “a paz de Deus, que excede todo o entendimento” (Filip. 4:7). Desejo apenas ser um dos que experimentam essa paz celestial interior.
Na congregação, hoje, encontram-se Jeff e Joyce Underwood, de Pocatello, Idaho. Eles são os pais de Jeralee e mais cinco crianças. Jeff trabalha na equipe de manutenção que cuida de algumas de nossas capelas de Pocatello, Idaho. Joyce é mãe e dona-de-casa. Um dia, em julho passado, a filha deles, Jeralee, de onze anos, batia de porta em porta, fazendo a cobrança pelo jornal que entregava. Jeralee não voltou para casa—nem naquele dia nem no dia seguinte—nunca mais.
Duas mil pessoas da região saíram para procurá-la dia após dia. Outras igrejas mandaram apoio e alimento para a equipe de busca. Descobriram que Jeralee fora seqüestrada e brutalmente assassinada por um homem cruel. Quando seu corpo foi encontrado, toda a cidade ficou atemorizada e chocada. Todos os segmentos da comunidade demonstraram amor e solidariedade a Jeff e Joyce. Alguns iraram-se, demonstrando desejo de vingança. Após o encontro do corpo de Jeralee, Jeff e Joyce apareceram com grande compostura ante as câmeras de televisão e em outros meios de comunicação para expressar publicamente seus sinceros agradecimentos a todos os que ajudaram na busca e que demonstraram solidariedade e amor. Joyce disse: “Eu sei que o Pai Celestial ouviu e atendeu a nossas orações e trouxe nossa filha de volta”. Jeff disse: “Não temos mais dúvida a respeito de onde ela está”. Joyce continuou: “Aprendi muito sobre o amor esta semana; sei, também, que existe muito ódio. Observei as manifestações de amor e quero sentir esse amor, e não o ódio. Podemos perdoar”.
O Élder Joe J. Christensen e eu, representando as Autoridades Gerais, estávamos entre os milhares de privilegiados que compareceram ao funeral de Jeralee. O Espírito Santo abençoou maravilhosamente a reunião e levou paz à alma de todos os presentes. Mais tarde, Presidente Kent W. Howard, presidente de estaca de Jeralee, escreveu: “A família Underwood recebeu cartas tanto de membros da Igreja como de não-membros, dizendo que oraram por Jeralee, que não oravam havia anos e, por causa disso, sentiram desejo de voltar para a Igreja”. O Presidente Howard continuou: “Nunca saberemos exatamente o quanto este caso despertou interesse pela Igreja e ajudou na reativação de membros. É impossível determinar a extensão dos efeitos que a vida de Jeralee terá sobre incontáveis gerações”. Muitos filiaram-se à Igreja por quererem saber que tipo de religião pôde dar à família Underwood a força espiritual que demonstraram.
Menciono o bem resultante desse trágico acontecimento com total aprovação e incentivo dos pais de Jeralee. Sua doce filha foi como o rapaz que tinha apenas cinco pães de cevada e dois peixinhos para dar à causa do Salvador, mas, pelo poder de Deus, milhares foram alimentados espiritualmente.
Testifico que o evangelho que ensinamos “é o poder de Deus para salvação”, para todos os que escutam e obedecem (Rom. 1:16), independentemente de seus talentos e aptidões. Em nome de Jesus Cristo. Amém.