“A Mim O Fizestes”
“As obras de bondade e amor ao proximo não buscam elogios ou recompensas e são freqüentemente realizados de todo o coração, nos lares humildes dos devotados servos do Senhor.”
No ano que passou adquiri uma visão nova das palavras do Salvador, registradas em Mateus:
“Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? ou com sede, e te demos de beber?
E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? ou nu, e te vestimos?
E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te?
E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.” (Mateus 25:37–40.)
Em visitas a mais de trinta estacas de Sião durante o ano passado, senti que minha vida foi abençoada e minha fé edificada ao observar a demonstração de amor cristão e serviço discreto e sem alarde, na vida de incontáveis fiéis santos dos últimos dias.
Esses exemplos de caridade, o puro amor de Cristo, não se acham restritos a localizações geográficas, idade, sexo ou época da vida. Tais obras de bondade e amor ao próximo não buscam elogios ou recompensas e são freqüentemente realizadas de todo o coração, nos lares humildes dos devotados servos do Senhor.
Permiti-me relatar alguns exemplos, extraídos da vida de verdadeiros seguidores de Cristo.
Ao ser designado para assistir a uma conferência de estaca eu e o Élder Paramore fomos abençoados com a visita ao lar de um estimado irmão que, num trágico acidente de trabalho, no dia 26 de agosto de 1958, caiu de cabeça de uma torre de resfriamento, num buraco de quase 10 metros de altura, ficando paralítico dos ombros para baixo. Nos trinta e um anos seguintes, ele se tornou um dos quadriplégicos que sobreviveram por mais tempo na história da medicina. Ele não pôde assistir às reuniões da conferência, mas um vídeo curto e cuidadosamente preparado de sua vida e testemunho foi apresentado na sessão da conferência de sábado à noite. Ele não fica deitado numa cama, mas suspenso numa armação circular de metal, onde recebe cuidado devotado de enfermagem vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, desde o acidente, isso há mais de trinta e um anos.
Esse irmão, cujo lar visitamos depois da conferência, elogiou suas enfermeiras, seus líderes do sacerdócio, seus mestres familiares, e outros que durante esses longos anos permaneceram ao seu lado, assistindo-o em suas necessidades espirituais e temporais. Um sábio presidente de estaca chamou-o para ser o correspondente oficial dos missionários e militares de sua estaca. Senti-me muitas vezes inspirado ao ler suas cartas, enviadas no intuito de elogiar a fé demonstrada por jovens e dedicados missionários em todo o mundo.
Eu gostaria de citar duas linhas de uma dessas cartas missionárias: “Cristo é o único caminho para o céu. Todos os outros caminhos não passam de atalhos para a escuridão — o compromisso para com Cristo deve andar de mãos dadas com o compromisso para com a Igreja.”
Noutra conferência de estaca, numa reunião da Primária, no domingo de manhã, conheci duas bonitas filhas de um jovem médico santo dos últimos dias e sua devotada esposa. A mais velha estava numa cadeira de rodas, e a mais nova andava com grande esforço. Ambas sofrem de uma doença degenerativa de origem genética, considerada progressiva e incurável. De acordo com a sabedoria médica, o tempo de vida delas é extremamente limitado. Os olhos das meninas eram belos e claros, cheios de fé e amor ao Salvador, cuja presença se tornara real para elas, graças a pais e avós amorosos e devotados professores da Igreja.
Para preencher o vazio causado pelo profundo desejo de ter mais filhos, os devotados pais tinham adotado mais duas belas filhas, de outro país. Ao invés de amaldiçoarem a Deus, como Jó foi encorajado a fazer por seus amigos, por causa das provações que lhe testaram a fé, este casal estendeu seu amor para as duas filhas adicionais, abençoadas por serem criadas numa casa cheia de fé, amadas por pais cujos corações demonstram o puro amor de Cristo.
Em seguida a uma recente conferência de estaca, a irmã Lindsay e eu fomos abençoados com o privilégio de visitar outra fortaleza de fé, localizada no estado rural de Idaho. O jovem pai desse lar sofria de grave enfermidade. Ficou gravada em minha memória a visão de uma mãe com cinco filhos, juntamente com os líderes do quorum do sacerdócio ao qual pertencia esse irmão, ajoelhados em volta de sua cama, rogando ao Pai Celestial pela vida desse bom homem. Foi-lhe administrada uma bênção, dentro deste círculo de fé. Recentemente tivemos a bênção de encontrar novamente com esse jovem casal, que nos prestou um belo testemunho, uma humilde efusão de espírito, de que o Senhor fora o responsável pela restauração da saúde do marido.
Em outra conferência de estaca, uma querida irmã, confinada a uma cadeira de rodas, testificou como foi fortalecida pelo sentimento de amor advindo ao seu coração ao ler o Livro de Mórmon. Antes seu devotado marido pôde ajudá-la a se ajustar aos efeitos atrofiantes de sua enfermidade. Agora era ele quem estava preso à cama, e ela falava de gratidão ao Senhor, por ter-lhe dado forças para ser mais auto-suficiente e poder cuidar melhor de suas próprias necessidades. Havia recebido forças adicionais até mesmo para atender as muitas necessidades de seu amado companheiro, que durante anos cuidara dela com carinho. Familiares amorosos e membros da Igreja também se mostraram prestativos, de modo que o casal permaneceu em seu próprio lar, com preciosas lembranças de antigos e felizes relacionamentos familiares.
Disse o Presidente Kimball: “O Senhor responde a nossas orações, mas é geralmente por meio de outra pessoa que ele cuida de nossas necessidades.” Um incidente na última parte do ministério do Presidente Kimball ajudou-me a compreender melhor sua mensagem, e como em sua própria vida ele testemunhou da veracidade de seu inspirado conselho.
Como presidente de estaca nessa época, fui a um hospital local, visitar uma irmã que sofria de uma enfermidade terminal. Há mais de quarenta anos, freqüentei a escola com essa irmã e seu marido, namorados desde a infância. No entanto, não foram abençoados com filhos próprios e preencheram esse vazio servindo, ele como líder dos escoteiros, e sua companheira como “mãe escoteira”, ajudando uma infinidade de meninos durante toda uma geração.
Ao me aproximar do hospital naquele dia, meu coração estava cheio de pesar, prevendo o que aguardava esse escolhido casal dali para a frente. Esse dedicado irmão havia ficado durante semanas com sua companheira no hospital, noite e dia, confortando-a, aliviando seu sofrimento e dores.
Ao me aproximar do quarto dela naquele dia, encontrei meu amigo, que me recebeu no corredor. Ao contrário das outras vezes em que os visitei e vi refletido no semblante dele o peso da provação, desta vez seu rosto estava radiante e os olhos brilhavam. Antes de eu pronunciar uma só palavra, ele disse: “Você não pode adivinhar o que aconteceu. Quando eu e minha mulher estávamos tão acabrunhados, o Presidente Kimball, veio-nos visitar” — apesar de ser ele mesmo um paciente do hospital, onde acabara de passar por uma cirurgia. “Ele orou conosco e nos abençoou, e foi como se o próprio Salvador tivesse vindo aliviar nosso fardo.” Muitos outros pacientes daquele hospital, devo adicionar, receberam uma bênção semelhante, daquele que sabia o que era dor e sofrimento.
Em minha própria vida tenho sentido em grande escala o amor do Salvador, através da bondade de muitos de seus servos. Reconheço, como o Rei Benjamim, que se servíssemos o Salvador com toda nossa alma, ainda assim seríamos servidores inúteis. (Vide Mosiah 2:21.) E isto por causa do seu grande amor e do sacrifício expiatório por todos nós, cada um de seus filhos.
Há alguns meses, o corpo de um patriarca de noventa anos de idade, amigo de meu pai, foi reverentemente enterrado e descansa neste vale. Meu pai faleceu quando a Grande Depressão de 1932 estava no auge, seguido, dez dias depois, de meu irmão mais velho, então com quatorze anos. Durante os quarenta e sete anos de viuvez de minha mãe, essa alma gentil visitou freqüentemente nossa família, dando-nos conselhos sábios, incentivo e bênçãos do sacerdócio. Seu exemplo e interesse, e a bondade demonstrada por muitos outros líderes do sacerdócio e vizinhos amigos, ajudaram minha mãe e seus cinco filhos restantes a enfrentarem os problemas da depressão econômica, guerras e as muitas influências mundanas e desafios diários que enfrentamos. Esse irmão tocou, de muitas maneiras, a vida de outros, em circunstâncias similares.
Para mim ele foi a síntese da “religião pura”, descrita na epístola de Tiago: “Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo.” (Tiago 1:27.)
Nestes dias difíceis é grande a necessidade de ministrar “a um destes pequeninos” filhos do Pai Celestial. (Vide Mateus 25:40.) Como precisamos do dom de discernimento, sabedoria e caridade, para saber como ajudar nossos irmãos a se erguerem para um nível mais alto!
Oro para que dia após dia procuremos com diligência cuidar dos negócios do Pai (vide Lucas 2:49), que são amar e servir ao próximo — alimentando os que têm fome, vestindo os que estão despidos e confortando os que choram (vide Mateus 25:37–39), erguendo as mãos que pendem e fortalecendo os joelhos enfraquecidos (vide D&C 81:5) — e isto acreditando na doutrina do Salvador e vivendo-a, seguindo o seu exemplo e colocando em primeiro lugar as coisas do reino. Oro por isto humildemente em nome de Jesus Cristo, amém.