A Liahona
Enterrar as Nossas Armas de Rebelião
Novembro de 2024


13:12

Enterrar as Nossas Armas de Rebelião

Que possamos enterrar — bem, bem fundo — qualquer elemento de rebelião contra Deus nas nossas vidas e substituí-lo por um coração e uma mente solícitos.

O Livro de Mórmon regista que, aproximadamente noventa anos antes do nascimento de Cristo, os filhos do rei Mosias iniciaram aquilo que seria uma missão de catorze anos entre os lamanitas. Ao longo de várias gerações, foram feitos esforços infrutíferos para levar o povo lamanita a acreditar na doutrina de Cristo. Porém, desta vez, por intermédio das intervenções milagrosas do Espírito Santo, milhares de lamanitas foram convertidos e tornaram-se discípulos de Jesus Cristo.

Lemos: “E tão certo quanto o Senhor vive, assim também quantos acreditaram, ou seja, quantos foram levados a conhecer a verdade pelas pregações de Amon e [dos] seus irmãos, segundo o espírito de revelação e de profecia e o poder de Deus que fazia milagres por meio deles — sim, digo-vos que, assim como o Senhor vive, todos os lamanitas que acreditaram [nas] suas pregações e foram convertidos ao Senhor nunca apostataram”.

A chave para a conversão duradoura deste povo é declarada no versículo seguinte: “Pois tornaram-se um povo justo e depuseram as armas [da] sua rebelião, para não mais lutarem contra Deus nem contra qualquer [dos] seus irmãos”.

Esta referência às “armas de rebelião” era tão literal quanto figurativa. Significava as suas espadas e outras armas de guerra, mas também a sua desobediência a Deus e aos Seus mandamentos.

O rei desses lamanitas convertidos expressou-o da seguinte forma: “E agora eis que, meus irmãos, […] tudo o que pudemos fazer […] foi arrependermo-nos de todos os nossos pecados e dos muitos assassinatos que tínhamos cometido e conseguir que Deus os tirasse [do] nosso coração, porque isto foi tudo [o] que pudemos fazer para [nos arrependermos] o suficiente perante Deus, a fim de que ele nos tirasse [a] nossa mancha”.

Reparem nas palavras do rei, não só o arrependimento sincero do povo levou ao perdão dos seus pecados, como Deus também removeu a mancha desses pecados e até o desejo de pecar dos seus corações. Como sabem, em vez de arriscarem um regresso ao seu estado anterior de rebelião contra Deus, eles enterraram as suas espadas. E ao enterrarem as suas armas físicas, com os corações transformados, enterraram também a sua disposição para pecar.

Podemos questionar-nos sobre o que podemos fazer para seguir este padrão de “[depor] as armas da [nossa] rebelião”, sejam elas quais forem, e de nos tornarmos tão “convertidos ao Senhor” que a mancha do pecado e o desejo de pecar são removidos do nosso coração e nunca mais caímos.

A rebelião pode ser ativa ou passiva. O exemplo clássico de rebelião intencional é Lúcifer, que, no mundo pré-mortal, se opôs ao plano de redenção do Pai e levou outros a também se oporem “e, naquele dia, muitos o seguiram”. Não é difícil discernir o impacto da sua rebelião contínua na nossa própria época.

O trio profano de anticristos do Livro de Mórmon — Serém, Neor e Corior — fornece um estudo clássico de rebelião ativa contra Deus. A tese geral de Neor e Corior era a de que não há pecado; portanto, não há necessidade de arrependimento e não há um Salvador. “Cada homem [prospera] segundo [a] sua aptidão e cada homem [conquista] segundo [a] sua força; e nada que o homem [faça é] crime.” O anticristo rejeita a autoridade religiosa, ao caracterizar as ordenanças e os convénios como representações “impostas por sacerdotes antigos para usurparem o poder e exercerem autoridade”.

William W. Phelps

Um exemplo dos últimos dias de rebelião intencional com um final mais feliz, é a história de William W. Phelps. Phelps filiou-se à Igreja, em 1831, e foi nomeado tipógrafo da Igreja. Ele editou várias das primeiras publicações da Igreja, escreveu vários hinos e serviu como escrevente de Joseph Smith. Infelizmente, ele voltou-se contra a Igreja e contra o Profeta, ao ponto de prestar falso testemunho contra Joseph Smith num tribunal de Missouri, o que contribuiu para a prisão do Profeta naquele estado.

Mais tarde, Phelps escreveu a Joseph a pedir perdão. “Conheço [a] minha situação, vocês [conhecem-na] e Deus [conhece-a] e quero ser salvo se [os] meus amigos me ajudarem”.

Na sua resposta, o Profeta declarou: “É verdade que sofremos muito em consequência do teu comportamento. […] Contudo, o cálice foi bebido, a vontade do nosso Pai Celestial foi cumprida e ainda estamos vivos. […] Vem, pois, irmão querido, que finda é a peleja, pois os amigos no princípio são novamente amigos no final”.

Com um arrependimento sincero, William Phelps enterrou as suas “armas de rebelião” e foi recebido novamente em plena comunhão para nunca mais apostatar.

No entanto, a forma mais insidiosa de rebelião contra Deus, talvez seja a versão passiva: ignorar a Sua vontade na nossa vida. Muitos dos que nunca considerariam uma rebelião ativa podem, mesmo assim, opor-se à vontade e à palavra de Deus, seguindo o seu próprio caminho sem ter em conta a orientação divina. Lembro-me da canção tornada célebre, há uns anos, pelo cantor Frank Sinatra, com a conhecida frase: “I did it my way” (Fi-lo à minha maneira). Certamente, na vida há muito espaço para preferências pessoais e escolhas individuais, mas quando se trata de questões de salvação e vida eterna, a nossa canção principal deve ser: “Fi-lo à maneira de Deus”, porque realmente não há outra maneira.

Considerem o exemplo do Salvador em relação ao batismo. Ele submeteu-se ao batismo como uma demonstração de lealdade ao Pai e como um exemplo para nós:

“Mas, embora sendo santo, mostra aos filhos dos homens que, segundo a carne, se humilha ante o Pai e testifica-lhe que lhe será obediente na observância dos seus mandamentos. […]

E disse aos filhos dos homens: Segui-me. Portanto, meus amados irmãos, poderemos nós seguir a Jesus se não estivermos dispostos a guardar os mandamentos do Pai?”

Não existe o “à minha maneira” se quisermos seguir o exemplo de Cristo. Tentar encontrar um caminho diferente para o Céu é como a futilidade de trabalhar na Torre de Babel em vez de olhar para Cristo e para a Sua salvação.

As espadas e outras armas que os conversos lamanitas enterraram eram armas de rebelião devido à forma como eles as tinham usado. Esse mesmo tipo de armas nas mãos dos seus filhos, sendo usadas em defesa da família e da liberdade, não eram de modo algum armas de rebelião contra Deus. O mesmo acontecia com essas armas nas mãos dos nefitas: “Não estavam [a lutar] pela monarquia nem pelo poder, mas lutavam [pelos] seus lares e sua liberdade, suas esposas e seus filhos e por tudo [o] que possuíam; sim, [pelos] seus ritos de adoração e [a] sua igreja”.

Da mesma forma, há coisas na vida que podem ser neutras ou até mesmo inerentemente boas, mas que, usadas da forma errada, se tornam “armas de rebelião”. As nossas palavras, por exemplo, podem edificar ou rebaixar. Como disse Tiago:

“Mas nenhum homem pode domar a língua. É um mal que não se pode refrear, está cheia de peçonha mortal.

Com ela bendizemos a Deus, o Pai, e com ela maldizemos os homens, feitos à semelhança de Deus.

De uma mesma boca procedem bênção e maldição. Meus irmãos, não convém que isso se faça assim”.

Há muito no discurso público e pessoal de hoje que é malicioso e mesquinho. Há muita conversa que é vulgar e profana, mesmo entre os jovens. Este tipo de linguagem, é uma “[arma] de rebelião” contra Deus, “[cheia] de peçonha mortal”.

Consideremos outro exemplo de algo que é essencialmente bom, mas que pode virar-se contra as orientações divinas: a carreira profissional. É possível encontrar verdadeira satisfação numa profissão, vocação ou serviço, e todos somos beneficiados por aquilo que pessoas dedicadas e talentosas, em diversos campos de atuação, realizaram e criaram.

Ainda assim, é possível que a devoção à carreira profissional se torne o foco principal da vida de alguém. Então, tudo o resto se torna secundário, inclusive qualquer reivindicação que o Salvador possa fazer sobre o tempo e o talento da pessoa. Tanto para os homens quanto para as mulheres, renunciar a oportunidades legítimas de casamento, deixar de se apegar ao cônjuge e de o elevar, deixar de cuidar dos filhos ou até mesmo evitar intencionalmente a bênção e a responsabilidade de criar os filhos, apenas para progredir profissionalmente, pode transformar uma conquista louvável numa forma de rebelião.

Outro exemplo diz respeito ao nosso corpo físico. Paulo relembra-nos que devemos glorificar a Deus tanto no corpo como no espírito e que este corpo é o templo do Espírito Santo, “o qual tendes da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos”. Assim, temos um interesse legítimo em dedicar tempo a cuidar do nosso corpo da melhor forma possível. Poucos de nós atingirão o pico de desempenho que vimos recentemente nas conquistas dos atletas olímpicos e paraolímpicos e alguns de entre nós estão a sofrer os efeitos da idade, ou aquilo a que o Presidente M. Russell Ballard chamou de “os rebites que se soltam”.

No entanto, creio que agrada ao nosso Criador quando fazemos o melhor que podemos para cuidar da Sua maravilhosa dádiva de um corpo físico. Seria um sinal de rebelião desfigurar ou profanar o próprio corpo, abusar dele ou deixar de fazer o possível para ter um estilo de vida saudável. Ao mesmo tempo, a vaidade e a preocupação com o nosso aspeto físico, aparência ou vestuário podem ser uma forma de rebelião no extremo oposto, levando-nos a adorar a dádiva de Deus em vez de Deus.

No fim, enterrar as nossas armas de rebelião contra Deus significa simplesmente ceder ao influxo do Espírito Santo, despojarmo-nos do homem natural e tornarmo-nos “[santos] pela expiação de Cristo”. Significa colocar o primeiro mandamento em primeiro lugar na nossa vida. Significa deixar Deus prevalecer. Se o nosso amor a Deus e a nossa determinação de O servir com todo o nosso poder, mente e força se tornarem a bitola pela qual julgamos todas as coisas e tomamos todas as nossas decisões, teremos enterrado as nossas armas de rebelião. Pela graça de Cristo, Deus perdoará os nossos pecados e rebeliões do passado e removerá a mancha desses pecados e rebeliões do nosso coração. Com o tempo, Ele até removerá qualquer desejo de praticar o mal, tal como fez com os conversos lamanitas do passado. Depois disso, nós também “nunca [cairemos]”.

Enterrar as nossas armas de rebelião leva a uma alegria única. Juntamente com todos os que já se converteram ao Senhor, somos “levados a cantar [o cântico do] amor que redime”. O nosso Pai Celestial e o Seu Filho, o nosso Redentor, reafirmaram o Seu compromisso incessante para com a nossa felicidade plena através do mais profundo amor e sacrifício. Sentimos o amor d’Eles diariamente. Certamente podemos retribuir com o nosso próprio amor e lealdade. Que possamos enterrar — bem, bem fundo — qualquer elemento de rebelião contra Deus nas nossas vidas e substituí-lo por um coração e uma mente solícitos. Em nome de Jesus Cristo. Amém.